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A derrota do México frente aos Estados Unidos foi um início da reconciliação

Francisco Espinosa García
Raúl Jiménez e Edson Álvarez comemoram o primeiro golo do México contra os Estados Unidos
Raúl Jiménez e Edson Álvarez comemoram o primeiro golo do México contra os Estados UnidosSIMON BARBER/ Getty Images South America/ Getty Images via AFP
Na manhã de terça-feira, 15 de outubro, Javier Aguirre sentiu fortes dores nas costas durante o treino da seleção mexicana antes do jogo contra os Estados Unidos, em Guadalajara. A dor foi tão insuportável que ele teve que ir à clínica do famoso Rafael Ortega e, ao sair do local, o técnico da seleção foi recebido por um enxame de jornalistas que o aguardavam na saída.

No México, o cargo de técnico do El Tri é tão importante - ou até mais - do que a pessoa que ocupa a presidência do país. Neste país que ama o futebol e que se aproxima do júbilo patriótico, aquele que tem nas suas mãos o estado de espírito geral de uma base de fãs que seguirá todos os seus passos e gestos.

Assim, quando se soube que Aguirre estava na clínica do Dr. Ortega, que já operou e reabilitou milhares de futebolistas mexicanos, e enquanto a imprensa começava a especular sobre o que o treinador estava a sofrer, o estado de espírito dos adeptos era elevado.

O clima de uma bancada que já estava frustrada e abandonada pela realidade do El Tri não sabia se ria ou chorava com o que estava acontecendo.

Mas Javier, sempre jocoso e capaz de fazer parecer que tem tudo sob controlo, riu quando viu toda a imprensa esperando por ele do lado de fora da clínica e disse: "Não sejam fofoqueiros", provocando risos dos repórteres. O talento de El Vasco serviu para lhe dar um pouco de calma em meio a uma tempestade de identidade que o México vem sofrendo desde o Catar 2022.

Desde que Aguirre assumiu sua terceira passagem pelo comando da seleção, e apesar de os dirigentes estarem determinados a se distanciar da torcida e de os jogadores nacionais não estarem vivendo seu melhor momento, o clima no El Tri vem mudando pouco a pouco.

Javier Aguirre, durante o jogo entre México e EUA
Javier Aguirre, durante o jogo entre México e EUASIMON BARBER/ Getty Images South America/ Getty Images via AFP

Lar, doce lar

No entanto, embora do ponto de vista desportivo e de gestão de crise a chegada do El Vasco tenha sido um sucesso, o novo projeto precisava de uma vitória clara e convincente para estabelecer uma base sólida para a nova era.

E, talvez o mais urgente, para acalmar os ânimos de um país mais distante do que nunca da sua seleção.

No início do ano, a Federação Mexicana de Futebol anunciou com grande alarde um amistoso contra os Estados Unidos em Guadalajara, uma das cidades mais importantes do país. A partida, marcada para o Estádio Akron, do Club Deportivo Guadalajara, foi anunciada como um retorno ao solo mexicano depois de uma longa e comum jornada em solo americano.

Na véspera do jogo, na terça-feira, dia 15, os dirigentes ficaram tão assustados com a indiferença das pessoas em comprar bilhetes para o jogo que tiveram de pedir ajuda às autoridades governamentais, ansiosas por que Guadalajara acolhesse o próximo Campeonato do Mundo.

Neste contexto, o facto de as bancadas do estádio do Chivas estarem vazias não era uma opção. Sem mais delongas, foi o governo que ficou com a grande maioria dos ingressos para o jogo e os distribuiu ao público com dinâmicas e promoções.

Com o estádio quase cheio, o México entrou em campo com Andrés Guardado como bandeirinha em seu último jogo com El Tri, pelo menos como jogador - especula-se que, mais cedo ou mais tarde, ele fará parte da equipa técnica de Aguirre - e diante de uma multidão expetante e vaiada, preparada para outra possível má atuação, especialmente contra os Estados Unidos, o rival mais odiado da CONCACAF.

Aguirre avisou na coletiva antes da partida: sua equipe pode perder um jogo, isso é tudo, mas o que ele jamais aceitaria era que seus jogadores entrassem em campo sem a atitude e o orgulho de defender o brasão na camisa, ao lado do coração. E essa mensagem, que ecoa na seleção mexicana desde a sua chegada, foi vislumbrada numa noite de céu aberto em Guadalajara.

Vitória merecida

O México não apenas derrotou os Estados Unidos, mas o fez de forma enfática pela maneira como o jogo se desenrolou, mas principalmente pelo mantra que vem sendo repetido inúmeras vezes nas últimas semanas: não havia dúvidas de que a seleção mexicana devorava os odiados rivais pela atitude. E, como se fosse simbólico, a prova de que podem voltar a competir veio em solo mexicano.

César Huerta em frente a Joe Scally durante o jogo entre México e EUA
César Huerta em frente a Joe Scally durante o jogo entre México e EUASIMON BARBER/ Getty Images South America/ Getty Images via AFP

Para desgosto dos dirigentes, que certamente não se importarão com esse aspeto simbólico porque ele não se reflete em milhões de dólares, a seleção nacional iniciou nesta quarta-feira um necessário pedido de desculpas ao seu próprio povo, em seu solo e com uma postura aguerrida que sempre esteve ligada à idiossincrasia mexicana.

Como se estivesse previsto, como se fosse algo já escrito, não se pode ignorar que a oportunidade de voltar ao bom caminho, após anos de obscuridade ideológica e desportiva, surgiu em Guadalajara e contra os Estados Unidos.

Guadalajara e contra os Estados Unidos, uma equipa que sofreu a pior derrota da história nacional no Campeonato do Mundo Coreia-Japão e que não era derrotada desde 2019.

Raúl Jiménez

E essa vitória por 2-0 foi sustentada por Raúl Jiménez, um avançado com fome de recuperar o tempo perdido que uma desagradável lesão na cabeça lhe roubou desde a pandemia. Longe vão os tempos em que o jogador de Querétaro jogou sabendo que tem capacidade para ser a referência que o México precisa para o Campeonato do Mundo.

Com a confiança em alta depois de um grande arranque com o Fulham na Premier League, Raúl marcou um grande golo de livre e esteve indefeso perante a defesa dos Estados Unidos, uma equipa em plena conversão e com os seus próprios problemas que, desde há uma semana, são questões que terão de ser resolvidas pelo argentino Mauricio Pochettino, que no final do jogo veio apertar a mão a Javier Aguirre.

Após a vitória clara, depois de aplaudido de pé por um estádio quase cheio e com a memória colectiva a tentar conter o sentimento de emoção, El Vasco sentou-se na conferência de imprensa pós-jogo e fez o que tinha a fazer: sorriu, agradeceu ao Dr. Ortega por ter tratado as suas costas doridas e, embora satisfeito em geral, o treinador mexicano reiterou a sua missão de reformar a seleção nacional e recuperar o carinho do povo.

"A reconciliação com os torcedores está acontecendo com o desempenho. As pessoas não são estúpidas. Se vêem que a sua equipa luta, luta, morde e, se no final perde porque houve um erro, agradecem na mesma. As pessoas não se ficam pelo resultado. Elas querem se sentir representadas", disse Aguirre. E todo um país concorda