Marcelo Bielsa faz o Uruguai sonhar com futebol em estado puro
A renovação da Celeste, inicialmente vista com desconfiança, está a dar frutos: o Uruguai terminou o ano em segundo lugar nas eliminatórias sul-americanas para o Campeonato do Mundo de 2026, nos Estados Unidos, Canadá e México, atrás apenas da Argentina, atual campeã mundial.
O argentino de 68 anos estreou-se em maio, após vários meses de negociações com a Associação Uruguaia de Futebol (AUF), que apoiou-se no seu prestígio como treinador das seleções do seu país e do Chile, bem como de clubes da Argentina, México, Espanha, França e Inglaterra.
A chegada de um técnico estrangeiro que impunha novas táticas e novos rostos, no entanto, não empolgou. Para além do seu rosto sombrio, houve críticas por não convocar jogadores que tinham surgido sob o comando do antigo treinador Óscar Washington "Maestro" Tabárez, que se reformou em 2021 após um processo de mais de 15 anos em que reconciliou os uruguaios com a sua seleção, quarta classificada na África do Sul 2010 e vencedora da Copa América em 2011.
Mas Bielsa respondeu com uma série de conquistas que restauraram as esperanças dos adeptosda Celeste após um Catar 2022 sem brilho sob o comando do técnico anterior, o recém-demitido Diego Alonso, do Sevilla.
Seis vitórias em oito jogos, incluindo vitórias consecutivas sobre os grandes rivais Brasil e Argentina, geraram admiração e gratidão.
"Vi o jogo do Uruguai contra a Argentina na Bombonera e fiquei impressionado com a forma como jogaram", comentou o próprio Tabárez.
No dia 16 de novembro, em Buenos Aires, o Uruguai de Bielsa tirou a invencibilidade da Argentina de Lionel Scaloni desde a final do Catar 2022 com uma vitória por 2-0 que deixou o astro Leo Messi sem marcação.
Um mês antes, o Uruguai também tinha vencido o Brasil por 2-0 no lendário Estádio Centenário de Montevideu, pondo fim a uma seca de 22 anos contra a canarinha num jogo pré-Mundial, o primeiro marco de Bielsa.
"A vitória marca um ponto de viragem para o treinador argentino, que rejuvenesceu o seu plantel e trouxe alguns nomes que, pelo menos até 17 de outubro, ainda eram mal vistos por muitos em solo uruguaio", disse a FIFA no seu site após um confronto que gerou manchetes em vários idiomas.
"Futebol frenético"
Sob o comando de Bielsa, brilha o avançado Darwin Núñez (Liverpool), que marcou dois golos contra a Bolívia na última partida das eliminatórias e confirmou que há um substituto para o astro da era Tabárez, Luis Suárez.
Federico Valverde (Real Madrid), Ronald Araújo (Barcelona), Facundo Pellistri (Manchester United), Nahitan Nández (Cagliari), Giorgian de Arrascaeta (Flamengo) e Maximiliano Araújo (Toluca) também se destacaram.
"Ele é um técnico que tem as coisas muito claras", disse Nández aos repórteres no mês passado.
Até mesmo Suárez - melhor marcador do Uruguai com 68 golos em 134 jogos desde 2007 - disse não estar incomodado apesar de Bielsa o ter convocado apenas para a sexta jornada das eliminatórias sul-americanas, e depois de sua espetacular atuação pelo Grémio Porto Alegre, mesmo tendo 36 anos de idade.
"Vimos um Uruguai muito bom ofensivamente", disse "El Pistolero" à AUFTV sobre a gestão de Bielsa, destacando a marca do técnico argentino na "nova geração que está a chegar".
O ex-avançado uruguaio Diego Forlán, vencedor da Bola de Ouro na África do Sul 2010, também elogiou o "futebol frenético" de Bielsa, que, segundo ele, é possível porque a abordagem do "Maestro" já existia antes.
"Nunca tivemos uma seleção tão rápida como esta. Adoro-o e é o futebol de hoje. Não foi por acaso que ganhámos ao Brasil e à Argentina", disse à Radio Sport 890.
Bielsa, uma das pessoas do ano de 2023 segundo o jornal uruguaio El Pais, foi nomeado para melhor treinador de seleção nacional pela Federação Internacional de História e Estatística do Futebol (IFFHS). Os prémios serão entregues a 1 de janeiro de 2024.
A era Bielsa começou com o Uruguai sendo coroado campeão mundial sub-20 pela primeira vez, o que para muitos foi um prenúncio de que, sob o comando de "El Loco", a Celeste pode trazer muita alegria a um país onde a bola é rei.