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Análise treinador Flashscore: A Inglaterra que jogava mal está na final e como jogou

António Barbosa
Declan Rice foi figura na Inglaterra
Declan Rice foi figura na Inglaterra AFP
Está a chegar ao fim o Euro-2024, prova que reúne a nata das seleções do Velho Continente na Alemanha, entre 14 de junho e 14 de julho. O treinador António Barbosa partilhou a sua análise com o Flashscore, relativamente à segunda meia-final.

Sem necessidade de mexer, uma vez que não tinham castigos ou lesões, os dois selecionadores iniciaram o jogo com as equipas que estariam mais próximas de vencer a partida. Os Países Baixos jogaram num 4x3x3, a Inglaterra jogou em 3x4x3.

As notas dos jogadores
As notas dos jogadoresFlashscore

Neste jogo contra os Países Baixos, a seleção da Inglaterra, quando em organização defensiva e fundamentalmente no setor médio, jogava com uma defesa à zona pressionante, com grande proximidade da linha defensiva, colocada, em muitos períodos do jogo – principalmente durante a primeira parte – no meio-campo. Apresentando Pickford; na cobertura da profundidade uma linha de três defesas – Walker, Mark Guehi e John Stones – procurava encurtar o espaço à sua frente, em particular o espaço nas costas de Declan Rice e de Kobbie Mainoo, que se aproximavam dos médios adversários de acordo com o lado da bola; juntamente com Harry Kane fechavam as linhas de passe no corredor central, com Bellingham e Phil Foden, vindos do corredor lateral para o corredor central, a forçarem o passe para o corredor central, e sempre que estes dois jogadores subiam, os laterais que jogaram nas suas costas, Saka e Trippier, encurtavam o espaço.

Quando no setor defensivo, a Inglaterra comportava-se como um bloco muito próximo, não deixando mais de 15 metros entre a linha defensiva – que jogou com referências de fora de jogo –, o defesa-central do lado da bola e o seu avançado.

Em organização ofensiva, na etapa de construção, é de realçar o número de vezes que os defesas-centrais da Inglaterra conseguiram passes frontais e ou diagonais, entrado no bloco dos Países Baixos quer no corredor central, quer no corredor lateral.

O mapa de passes de Inglaterra
O mapa de passes de InglaterraOpta by Stats Perform

Os dois médios eram jogadores de apoio e de ligação em particular Declan Rice, fundamentalmente no corredor lateral esquerdo.

Os passes de Declan Rice
Os passes de Declan RiceOpta by Stats Perform

No corredor lateral-direito, a variabilidade posicional entre Phil Foden, Saka e ainda Walker criaram inúmeras situações de finalização. Em particular através de Phil Foden.

Nas relações de corredor, no corredor lateral-direito realçamos Bukayo Saka na largura, Phil Foden no meio espaço, e em troca posicional Foden no corredor-central, Saka no meio espaço e Walker na largura; ou ainda Saka no meio espaço e Foden em rotura interlinhas (sobrelotação da zona). Criaram sempre muito perigo, com vários remates bem direcionados.

No corredor lateral-esquerdo, com ligeira maior evidência do ataque à profundidade por Bellingham, notou-se uma maior padronização do comportamento quer de Trippier quer de Luke Shaw na largura (uma vez que eram jogadores de pé aberto).

No corredor central, é de realçar o comportamento de Harry Kane. Serviu muitas vezes de jogador de ligação e de último passe com Foden, Bellingham e Mainoo muito próximos em particular, ou a atacar o espaço deixado por ele. E recorreu à zona frontal e ao espaço deixado, na frente da linha defensiva (baixo fora da área) para chutar à baliza.

Os toques de Kane na bola
Os toques de Kane na bolaOpta by Stats Perform

De realçar Phil Foden, que ofensivamente esteve em todo o campo, a receber em apoio no corredor central, no corredor direito, a ir na profundidade, a entrar nas costa de Harry Kane.

Os terrenos que Foden pisou
Os terrenos que Foden pisouOpta by Stats Perform

Na transição defensiva, os dois principais gatilhos na perda de posse de bola foram Bellingham e Foden com Mainoo e todo o bloco próximo com espaço por vezes no corredor central na frente de John Stones.

De salientar, pela negativa, a dificuldade nas bolas paradas defensivas, em concreto nos livres nos corredores laterais e cantos, principalmente na bola aberta (batida para fora). Neste instante de jogo, a Inglaterra comportou-se fundamentalmente com marcação homem a homem e foi pouco eficaz: só na segunda parte conseguiu vencer a primeira bola.

E os Países Baixos, o que procuraram fazer no jogo?

Na sua organização ofensiva, procuraram sair a jogar a quatro, com Van Dijk e De Vrij em zonas centrais; Aké e Dumfries os laterais baixos; médios mais vezes na largura apresentando Reijnders e Schouten e com profundidade e com Xavi Simons no apoio e profundidade.

As zonas que Simons pisou
As zonas que Simons pisouOpta by Stats Perform

Nesta etapa de construção, a seleção dos Países Baixos também tentou jogar com os laterais assimétricos e com um médio na construção no corredor lateral-esquerdo, em concreto Aké, primeiro, e Veerman, depois, mais projetados.

Quando no setor médio, os alas Malen e Gakpo, em zonas mais interiores com o ponta-de-lança Depay e depois Weghorst numa posição intermédia a servir de apoio/arrastar espaço nas costas dos defesas adversários.

Gakpo foi o jogador mais influente ofensivamente na equipa. Começando o jogo em zonas interiores, procurando atacar a profundidade. Mas quando começou a jogar em zonas exteriores (no corredor lateral esquerdo) – ou o jogo partia e ele conseguia receber a bola de frente para o seu defesa em situação de um para um, com a bola no seu pé, procurou servir os colegas mais adiantados.

As zonas que Gakpo pisou
As zonas que Gakpo pisouOpta by Stats Perform

Quando em organização defensiva, os Países Baixos jogavam em 1x4x1x4x1, com uma defesa à zona mista, onde a função do ponta-de-lança era fechar o espaço e linhas de passe, com a restante equipa em basculação e com grande propensão para encurtar espaço para o portador da bola ou a linha de passe seguinte.

A dinâmica do jogo, aspetos que influenciaram o jogo

Com um início de jogo cauteloso, característico de uma fase a eliminar, com duas equipas com elevada qualidade de processos e executantes, a Inglaterra entrou mais dominadora, com um jogo mais ofensivo. Mas no primeiro lance de real perigo, os Países Baixos chegaram ao golo.

Mas a Inglaterra continuou a impor o seu jogo ofensivo e consequentemente a produzir melhores lances de perigo, maior xG (golos esperados), mais posse, mais tentativas de golo, remates à baliza. Controlando e dominando a primeira parte, chegou naturalmente ao golo, através de penálti convertido por Harry Kane (nos últimos dez penáltis, bateu cinco para cada lado).

Os penáltis de Kane
Os penáltis de KaneOpta by Stats Perform

Ainda durante a primeira parte, Depay é substituído por lesão, entrando Veerman e ao intervalo, o treinador Ronald Koeman faz uma nova substituição com influência no jogo, promovendo a entrada de Weghorst. Este ponta-de-lança conseguiu explorar o espaço nas costas dos médios da Inglaterra, seja no chão, seja no ar, o que permitiu à sua seleção, quer em contra-ataque, quer em ataque posicional, e desde o seu guarda-redes ter uma linha de passe segura e vertical.

O mapa de passes dos Países Baixos
O mapa de passes dos Países BaixosOpta by Stats Perform

Na segunda parte o jogo tornou-se naturalmente mais pausado, com mais equilíbrios do que desequilíbrios. Mas aos 81’, a Inglaterra realizou duas alterações, em particular entrou Ollie Watkins, que ao minuto 90’, depois de um movimento na diagonal e de um primeiro toque que deixou a bola num espaço fechado, mas o mais favorável possível, realizou um remate na diagonal, no chão, ao poste distante.

Sobre o que nos diz a história

Num torneio curto com fases distintas, como é o Europeu, onde as seleções são compostas de muitos jogadores de diferentes formações, a jogarem em clubes e competições de várias latitudes, com ideias, modelos, sistemas tão diferentes, é comum e natural que, por vezes, as equipas não consigam dominar o jogo jogando em ataque posicional.

“Constatamos a existência de diferentes formas de interpretação do jogo e, como tal, de o jogar. A perceção entre o ‘jogar bem ou mal’ relaciona-se diretamente com o resultado obtido?”, escrevi em 2014 no livro “Os Jogos por Trás do Jogo”. Jogar bem é a capacidade que a equipa tem de encadear com fluidez e velocidade, os instantes, os momentos e a fase do seu jogar e por isso consequentemente vencer.

Foi do crescimento ocorrido, especialmente ao longo deste torneio, que a seleção de Inglaterra venceu, e as vitórias ou passagens nas diferentes fases e eliminatórias produziram ligação de confiança, conduzindo a jogar bem e a vencer dominando o adversário. 

António Barbosa, treinador de futebol
António Barbosa, treinador de futebolFlashscore