Análise Treinador Flashscore: Construção e evolução de um modelo de jogo em competição
Aculturação/alinhamento. A Seleção iniciou o jogo com o mesmo onze do jogo anterior, com o mesmo sistema e com poucas nuances táticas/estratégicas na sua forma de jogar. É de realçar que durante o período de Roberto Martínez, esta foi a primeira vez que a Seleção de Portugal o fez. Ao longo destes 20 jogos, houve naturais alterações de jogadores de jogo para jogo devido a lesões, castigos, observação em contexto de seleção e opções.
A forma de jogar de Portugal – como evoluiu neste jogo
A evolução foi no caminho da mestria e da simplicidade tática, respeitando os sistemas, as missões, tarefas e espaços e, fundamentalmente, os nossos jogadores. Isso permitiu um fato que assenta e serviu os na perfeição aos jogadores portugueses.
Em organização ofensiva, considerando que a seleção francesa colocava-se num bloco médio organizando-se com uma defesa à zona mista pressionante, com forte preocupação para anular os três jogadores do meio-campo de Portugal – em particular Vitinha –, no setor médio defensivo a Seleção construía com três jogadores: com Pepe, numa zona central, Rúben Dias, na meia-direita. Estes dois jogadores eram um bloco mais fixo, depois a rotatividade, inteligência e estratégia permitiu variações com as relações dos três jogadores do meio-campo juntamente com Bernardo Silva e com variações no terceiro homem entre eles: com Nuno Mendes mais baixo; Palhinha entre os defesas-centrais; Vitinha num corredor lateral, Bernardo entre os defesas centrais.
Esta última opção permitia criar superioridade numérica nesta etapa quando Portugal jogava num setor médio. Com Cancelo mais projetado, a dar largura no corredor direito de forma mais fixa, os médios trabalhavam nas costas dos médios da frança, Cristiano a variar o apoio com o ataque à profundidade e Rafael Leão fixo no corredor lateral-esquerdo, para criar situações de um para um.
A etapa de construção e finalização, fruto da intenção do selecionador nacional, tinha num setor médio um bloco mais fixo de três jogadores: Rúben Dias, Pepe e Palhinha. Os laterais variavam o ataque à profundidade no corredor central e o equilíbrio. Os defesas e os médios eram os jogadores preponderantes na etapa de construção do jogo de Portugal, em segurança, com a maioria dos passes a serem feitos no pé dos jogadores, em jogo de circulação para atrair a pressão através de passes para dentro do bloco francês, procurando arrastar as marcações para libertar espaço nas constas da linha média francesa, com algumas tentativas de ataque à profundidade, procurado Rafael Leão ou Ronaldo.
Na etapa de criação, a liberdade concedida a Bernardo Silva, juntamente com a dinâmica de relações dos jogadores do meio-campo entre Bruno Fernandes e Vitinha e pontualmente Palhinha, juntamente com a disposição da restante equipa, em particular a criação da largura por Rafael Leão e Cancelo (jogando contra duas linhas de 4 adversários), permitira que a Seleção conseguisse em largos períodos do jogo dominar os gauleses. Ainda sobre a fase de organização ofensiva, em particular na etapa de finalização, é de realçar que Portugal colocava poucos jogadores em zona de finalização, principalmente quando conseguia chegar à área através de um ataque-posicional e procurava terminar o processo ofensivo recorrendo a cruzamentos como forma de assistência. Também por isso, apenas num dos cruzamentos Portugal ganhou a primeira bola.
Na transição defensiva, observamos um posicionamento mais alto e agressivo de dois jogadores: Nuno Mendes e Rúben Dias. Este último esteve várias vezes a pressionar perto da grande área da seleção francesa e tendo como referência de homem Mbappé (principal referência na transição ofensiva da seleção francesa). De realçar a plasticidade do meio-campo, fruto da dinâmica instituída entre os médios, mobilidade e equilíbrios, do posicionamento de Bernardo Silva numa zona central do terreno de jogo e do baixo número de vezes que Portugal terminou o processo ofensivo (cruzamento ou remate) particularmente na 1º parte. Quando Portugal perdia a bola e não conseguia uma pressão frontal eficaz na reorganização defensiva, assistimos a forte concentração e disponibilidade dos jogadores de meio-campo em assegurar a segunda linha, a linha média com quatro jogadores, condicionando a velocidade do ataque da seleção francesa.
Organização defensiva – defender de forma necessária
Neste momento Portugal defendeu em 1x4x4x2, mas variava e variou o seu posicionamento. Fundamentalmente colocada no setor médio, pontualmente pressionava no setor ofensivo, mas privilegiou o equilíbrio e a superioridade numérica no seu setor defensivo. De realçar como Rafael Leão variava a pressão no setor ofensivo e médio, procurando condicionar e pressionar. Mas no setor médio e defensivo, Rafael ficava como principal referência na transição na profundidade e era o médio que defendia o corredor lateral do seu lado. E como variou, com a entrada de Dembélé e este a criar algumas situações de um para um com sucesso, a equipa portuguesa passou a defender em 1x4x4 x2, com Rafael Leão a defender no corredor lateral e no momento Bernardo Silva (como medio ofensivo) e Cristiano Ronaldo colocados mais fixos como jogadores de referência na transição ofensiva.
Transição ofensiva
Quando a Seleção Nacional conseguia tirar a bola de pressão, encadeando os passes e descobrindo o jogador para acelerar e explorando a situação de um para um de Rafael Leão, este conseguiu bem e durante longos períodos chegar ao último terço, muitas vezes em ações individuais. Mas a Seleção tinha poucos jogadores colocados dentro da área francesa, principalmente jogadores da segunda linha ofensiva, médios ou laterais. Poucas vezes venceram o duelo individual com os seus opositores (ganhando a frente ao adversário) e ganharam espaços primordiais para finalizar o processo ofensivo.
Bolas paradas – curiosa segurança
Como tem feito Portugal, defende com uma defesa fundamentalmente zonal que esteve muito solida, principalmente na primeira bola e organizada na segunda bola. Ofensivamente é de realçar a baixa eficácia em ganhar a primeira bola. Neste jogo, apesar do posicionamento com dois jogadores para realizarem a combinação (e contrariando os outros jogos do Europeu), tendencialmente a Seleção optou por bater as bolas paradas diretas, com Rúben Dias a ser a principal referência. Mas foi através de Bernardo Silva que Portugal teve a grande oportunidade de golo. o facto de não ganhar a primeira bola, permitiu que a seleção francesa procurasse e ligasse algumas transições, seguido deste instante ofensivo a favor de Portugal, apesar de termos superioridade nos jogadores de equilíbrio e uma marcação homem a homem a Mbappé, fundamentalmente na primeira parte do jogo.
O jogo, o tempo e o trabalho deram superioridade a Portugal
Era um jogo a eliminar, com duas seleções de elevado valor, ainda que distintas produzindo, por isso, um jogo esperado, muito preso ao sentido posicional, ao equilíbrio defensivo, preso às missões que podiam impedir o adversário de chegar ao golo, isto de ambas as partes. Com poucas situações claras de golo e com Portugal a dominar, porque a seleção francesa assim o pretendia, e com a França a controlar os espaços e a procurar na velocidade criar situações de um para um contra os nossos defesas centrais (embora não o conseguindo), realizando o dobro de passes realizados no último terço comparativamente com Portugal, embora somente com 1 remate de diferença entre as equipas.
A organização e equilíbrio era tão marcante que podemos verificar o baixo número de faltas, embora o histórico das duas seleções, neste europeu, assim o indicasse tendo em conta os 330 minutos em que Portugal não fez golos (mesmo sendo a seleção que mais produziu ofensivamente até este jogo). Por outro lado, jogávamos contra uma seleção com três golos marcados em toda a competição (dois autogolos e um penálti) e um golo sofrido (traço das equipas que vencem competições), momentos e especificidade da competição e tendência evolutiva do jogo.
Na segunda parte depois de um início com ascendente da seleção francesa, Portugal conseguiu controlar novamente o jogo, criando ao minuto 60 duas situações de golo através de Bruno Fernandes em rutura no espaço entre o defesa-central e o lateral e a chutar de primeira, seguido de João Cancelo, com remate exterior. Seguiu-se o lance entre Vitinha e Rafael Leão, conseguindo este ganhar a linha de fundo e a passar atrasado para Vitinha.
O jogo ficou mais solto, com a seleção francesa a criar algumas oportunidades como por exemplo Camavinga dentro da área. As substituições mexeram no jogo. Em particular na seleção francesa, Dembélé foi colocado ofensivamente na largura no corredor lateral-direito e pela sua qualidade técnica e pelo posicionamento tático, conseguiu criar várias dificuldades a Portugal nos minutos iniciais (um para um por fora; um para um a libertar espaço para Camavinga, movimento diagonal da direita para o meio em condução e outra vez movimento de arrastamento para o meio sem bola).
Portugal foi atrás desta alteração, começando a defender com Rafael Leão mais baixo, substituindo João Cancelo e Bruno Fernandes com a entrada de Nélson Semedo e Francisco Conceição. Esta dupla alteração mexeu positivamente com o nosso jogo, com Bernardo Silva no corredor central, mas principalmente Francisco Conceição a jogar fundamentalmente nos meios espaços com Semedo a ciar movimento de profundidade, no corredor lateral, para libertar Conceição para situações de um para um.
A entrada de Rúben Neves permitiu que Portugal conseguisse ligar o jogo na primeira etapa de construção com maior dinâmica, variabilidade e velocidade, ajudando ao crescimento da produção ofensiva.
Seguiu-se o prolongamento e o comportamento de Portugal neste período manteve-se, embora sendo mais dominadora, criando algumas situações de golo (comparativamente com a seleção francesa), realçado a combinação entre Nélson Semedo, Francisco Conceição e em que Cristiano Ronaldo chutou ao lado; ou o cruzamento de Francisco Conceição para João Félix, que de ângulo fechado cabeceou ao lado; ou mesmo, no final do prolongamento, numa transição ofensiva, recorrendo ao contra-ataque, uma ligação entre Ronaldo, Nuno Mendes e Bernardo Silva permitiu a Nuno Mendes rematar para defesa de Maignan. No decorrer do jogo a Seleção foi crescendo no número de situações de perigo próximas da baliza adversária.
Penáltis: a história não se repetiu
Os jogadores da seleção francesa bateram cinco grandes penalidades para o lado direito de Diogo Costa. Este, comportou-se fundamentalmente como um guarda-redes de antecipação. Entre os batedores de Portugal, os destros retardaram a chamada, procurando fixar o guarda-redes da França, Maignan, no centro da baliza, procurando libertar as malhas laterais (nesta situação ele comportou-se como guarda-redes de reação), ambos chutaram para baixo e para a sua esquerda (cruzado inferior). Os jogadores esquerdinos, fizeram uma chamada contínua e bateram (aqui Maignan procurou antecipar) para a parte alta do lado direito (cruzado superior).
O desfecho nós sabemos, não conseguimos o fundamental: VENCER. Mas Portugal perdeu num jogo em que observámos e analisámos e sentimos que era possível vencer, porque os jogadores demonstraram, nas suas ações e comportamentos, uma concentração que era possível… era mesmo possível e os intervenientes fizeram-nos acreditar.
Como foi ouvido muitas vezes, no final do jogo, pela voz de jogadores e treinador, vamos continuar a crescer a partir deste ponto. Só assim se fazem vencedores com determinação, crença, capacidade de superação, trabalho, foco, união…. Todos os valores que Pepe demonstrou sempre ao longo de vários anos ao serviço de Portugal, com grande compromisso em ser português por convicção.
Foi um gosto analisar as exibições de Portugal para o Flashscore, cuja equipa desejo os maiores sucessos. Para os leitores, espero que tenham gostado tando de ler como eu de analisar. Obrigado!