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Arménia e Turquia utilizam o futebol como via diplomática, mas os adeptos não corresponderam

Bruno Henriques
O duelo no relvado ficou marcado por conflito fora dele
O duelo no relvado ficou marcado por conflito fora deleAFP
Os dois países estão no Grupo D da qualificação para o Campeonato da Europa. Não partilham relações diplomáticas devido ao genocídio ocorrido durante a Primeira Grande Guerra. Defrontaram-se pela primeira vez desde 2009.

Numa altura em que a UEFA tem particular atenção em separar países em conflito aberto, o sorteio de qualificação para o Europeu de 2024 ditou que Arménia e Turquia partilhassem o Grupo D. Não é inédito, já estiveram juntos na qualificação para o Mundial-2010, mas não deixa de assinalar um encontro entre dois países que não partilham qualquer relação diplomática e que até há bem pouco tempo estavam em conflito aberto.

Antes de mais, é preciso ir à raiz da questão. Arménia e Turquia disputam aquilo que é chamado de Genocídio Arménio que aponta para a morte de 1 a 1,5 milhões de habitantes daquele país por parte do Império Otomano durante a Primeira Guerra Mundial. A comunidade científica aceita o uso do termo genocídio (extermínio deliberado de um povo por diferenças étnicas, raciais, religiosas ou de nacionalidade), as república da Turquia (que sucedeu aos otomanos). Ancara defende-se que as mortes não terão sido superiores a 300 mil e que se deveram à fome, doença e guerras étnicas que grassaram no Império durante o primeiro conflito global.

A isto junta-se ainda uma disputa territorial. Estabelecida no tratado de Sèvres, em 1920, a fronteira da atual Arménia não corresponde ao território que era estabelecido antes do Império Otomano, com especial destaque para o monte Ararat, previamente no centro dos domínios arménios e que agora está perto de Yerevan, capital do país, mas em território turco.

Os últimos anos, no entanto, têm sido marcados por uma reaproximação dos dois países, que tem sido possibilitada pelo futebol. A primeira tentativa surgiu em 2008, no primeiro jogo oficial entre as duas seleções, na qualificação para o Mundial-2010. Meses antes, em abril, no dia do Genocídio, várias pessoas espezinharam a bandeira da Turquia, em protesto. Em setembro, o presidente Abdullah Gul tornou-se no primeiro alto-funcionário turco a visitar a Arménia, a convite do homólogo Serzh Sargsyan, para assistir o jogo e terá saído satisfeito com o resultado (2-0).

Após vários anos de nova polarização, as duas partes iniciaram mais um processo de reaproximação em 2021, que está a ter novos desenvolvimentos em 2023 quando a Arménia ofereceu apoio após o sismo que vitimou  mais de 50 mil pessoas na Turquia. E novamente, o jogo de futebol deste sábado foi usado como propaganda para tentar normalizar as relações, mas os adeptos não tiveram o mesmo entendimento.

No estádio Vazgen Sargsyan, o hino turco foi assobiado, os adeptos empunharam cartazes com os nomes das cidades do país vizinho escritas em arménio e com a palavra Némesis – nome da operação organizada pela Federação Revolucionária da Arménia que entre 1920 e 1922 levou a cabo os homicídios dos oficiais otomanos envolvidos no genocídio. Além disto foi elevada uma bandeira com a Águia de Taron, símbolo do Tseghakronismo, um movimento ultranacionalista da Arménia que defende o regresso ao território ancestral.

Quanto ao jogo, os turcos levaram a melhor, com uma vitória por 2-1 e estão na frente de um grupo onde, esperam disputar com Croácia e País de Gales um dos dois lugares de apuramento direto. Contudo, de certo que os adeptos não se vão esquecer da receção em Yerevan e vão preparar a resposta a 8 de setembro deste ano, quando for a vez da Arménia visitar a Turquia.

A águia de Taron atrás da seleção da Turquia
A águia de Taron atrás da seleção da TurquiaAFP