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Euro-2024: O desaparecimento dos golos de livre direto, um deles marcou o Espanha-França

Posicionamento e reação da barreira é um dos motivos para queda de golos de livre direto
Posicionamento e reação da barreira é um dos motivos para queda de golos de livre diretoProfimedia
Já não se vêem momentos como este e é uma pena! O remate do francês Michel Platini em direção à baliza espanhola do falecido guarda-redes Luis Arconada, na final do Euro-1984, pode parecer algo distante para os adeptos de hoje. E não é só por causa das imagens de há 40 anos. A própria essência desse golo tem um toque de história. Os golos de livres diretos são praticamente inexistentes e neste Euro não houve nenhum.

Acompanhe aqui as incidências do encontro

Quando o jornal britânico The Guardian recapitulou a fase grupos, foi o primeiro a mencionar este facto. É um facto preocupante. Afinal de contas, marcar um livre é uma disciplina à parte. Exige não só força nas pernas e horas de treino, mas também uma técnica perfeita e inteligência. Por isso é que era dominado pelos grandes artistas que marcaram o desporto.

Com o declínio dos clássicos craques, esta habilidade, cultivada por Pelé, Maradona, Beckham, Zidane, Messi e Ronaldo, está a desaparecer. Há 40 anos, Platini ajudou a desbloquear a final com um pontapé livre. Agora, França e a Espanha voltam a defrontar-se no maior duelo entre ambas desde então.

Naquela altura, houve 57 minutos de espera por um golo no Parque dos Príncipes, em Paris. Antes de Platini se colocar um metro atrás da grande área e disparar a bola para o poste direito. Mas Arconada estava a postos. O guarda-redes e capitão de longa data da seleção, a quem a La Roja devia a passagem à final, depois de a ter salvo anteriormente contra os alemães e os dinamarqueses.

No entanto, ele é recordado principalmente - para sua infelicidade - por este momento. Caiu no chão uma fração de segundo tarde demais, a bola escorregou por entre os braços e passou por baixo do corpo, ultrapassando a linha. Desde então, em Espanha, as falhas de guarda-redes semelhantes passaram a ser chamadas de Arconadas.

Até mesmo o árbitro checoslovaco Vojtech Christov, que apitou a final, confidenciou mais tarde que foi um golo incompreensível para ele. Tal como o veredito para os vencidos, que despoletou toda a situação após uma falta questionável.

Muito tempo depois, quando Platini se tornou presidente da UEFA, pediu a Arconada, antes da final do Euro-2008, em que a Espanha se preparava para defrontar a Alemanha, que fosse seu convidado para o jogo. "Achei que era bom convidar um antigo rival", explicou. E procurou desvalorizar o momento que pesava sobre o país derrotado. "Ele não tem nada que se culpar. Foi um remate perfeito", brincou.

O destino fez com que o troféu que ele tinha tirado aos espanhóis 24 anos antes fosse entregue a eles após a final, na sua função de dirigente. Era o primeiro título do país após 44 anos de espera...

Arconada foi assombrado por esse momento infeliz em todas as ocasiões. Era como se tivesse sido esquecido que aquele guarda-redes de apenas 1,78 metros, apelidado de El Pulpo, tinha conduzido a Real Sociedad a dois títulos consecutivos. O seu legado foi definitivamente limpo por Andrés Palop, o guarda-redes suplente da Espanha no Euro-2008. Foi com a camisola verde e preta do seu antecessor que Andrés Palop se apresentou a Platini para receber a medalha de ouro.

Platini na cerimónia de entrega das medalhas de ouro, em primeiro plano a camisola verde de Palop
Platini na cerimónia de entrega das medalhas de ouro, em primeiro plano a camisola verde de PalopProfimedia

Depois de vencer na meia-final, falou com um jornalista amigo de Arconada para que lhe emprestasse a camisola. Depois, assim que soou o apito na final do torneio, correu para o balneário para a vestir. "Quando recebi a medalha de ouro, disse ao Sr. Platini o que estava a usar por uma questão de honra. Ele assegurou-me que o Luís (Arconada) ficaria muito feliz", conta Palop.

Voltamos à questão inicial: livres falhados. Houve 108 golos no Euro na Alemanha, mas nenhum surgiu através desta situação de bola parada. Na história dos Campeonatos da Europa, isto só aconteceu uma vez, em 1972, quando foram disputados apenas quatro jogos. Há oito anos (com o aumento do número de participantes no torneio para 24), um recorde de quatro livres deu golo, enquanto no Euro-2020 apenas um.

O treinador polaco Bartek Sylwestrzak dedicou uns incríveis 24 anos ao estudo dos livres. É provavelmente o maior especialista do mundo na matéria. Concentra-se sobretudo na forma correta de bater na bola. Não está satisfeito com a situação atual. 

"Se os responsáveis compreendessem a oportunidade que esta bola parada oferece, se os jogadores se tivessem dedicado a ela na preparação... Mas os treinadores e analistas, que não sabem muito sobre o assunto, dizem: 'Não rematem de livre!'. É um absurdo e uma grande perda de oportunidade'", diz o especialista, que teve passagens por clubes como Midtjylland e Brentford.

Como exemplo, cita o médio James Ward-Prowse, do West Ham, que se destaca como especialista.

"Ele é a exceção. Todas as equipas deviam ter dois ou três jogadores assim", considera Sylwestrzak. A sua experiência com treinadores modernos não é nada animadora. "É muito comum os clubes  literalmente  desencorajarem os jogadores a fazerem algo extra. Tudo o que lhes interessa é estar em forma para o próximo jogo. Aqueles que querem melhorar quase têm de o fazer em segredo. Com esta abordagem, seria impossível produzir dos livres como Alessandro del Piero, Juninho Pernambucano ou Andrea Pirlo", salienta.

As estatísticas confirmam estas palavras. Nos últimos 15 anos, a proporção de remates diretos à baliza em pontapés livres no último terço nas cinco principais ligas europeias caiu de 25% (um em cada quatro) para 19% (nem sequer um em cada cinco), segundo o The Guardian.

No entanto, antes do início do Euro, havia esperança de que os adeptos ainda possam ver algum golo de livre direto. Até agora ainda não, talvez porque o único marcador na última edição foi apontado pelo dinamarquês Mikkel Damsgaard, na meia-final.

Os franceses são os mestres neste capítulo, dominando os registos do torneio tanto no número de golos marcados (cinco) como nos sofridos (três, juntamente com a Inglaterrra).