Quando tudo parece não estar alinhado, eis que o destino nos mostra que havia um motivo especial para a incerteza. Por outras palavras, Pedro Maranhão esteve perto de ceder à indefinição do seu futuro, após uma semana de muitas lágrimas, até que o Tondela bateu à sua porta.
O jovem brasileiro cumpriu um período de testes no emblema beirão, depois de passagens pelo Maia (distrital da AF Porto) e na AD Sanjoanense (Liga 3), e foi-lhe dada uma oportunidade. 2023/24 foi de "adaptação" a um novo contexto e 2024/25 está a ser uma bênção.
O Pedro, o Pedro do Bacabal, no Maranhão, é um dos destaques da Liga 2 e abriu o livro nesta entrevista exclusiva ao Flashscore.
"O nosso grupo é fantástico"
- Quatro vitórias e quatro empates nas oito primeiras jornadas da Liga 2. Está a ser melhor do que perspetivavam?
- Está a superar as expectativas, especialmente as minhas. Tenha uma meta pessoal, que só no final da época irei revelar, mas enquanto grupo não temos uma meta estipulada. Vamos jogo a jogo, com os pés no chão e com humildade. A mesma equipa que empatou os primeiros quatro jogos e que foi eliminada pelo Marialvas na Taça é a mesma que ganhou os últimos quatro jogos consecutivos. Isso é sinal de que o trabalho está a ser muito bem feito. Vamos continuar a pensar jogo a jogo.
- O Pedro cumpre a segunda época em Tondela, tendo já superado o total de minutos realizado na temporada passada. O que mudou em si?
- Acho que o primeiro ano foi de adaptação para mim e de muita superação. Este ano vim mais leve e preparei-me muito bem nas férias. Graças a Deus, começámos bem, tanto individualmente como coletivamente.
- Houve algumas mudanças no plantel e o treinador também é novo. Como apresenta o grupo?
- O nosso grupo é fantástico, excelente. Tem a base da época passada e chegou malta de qualidade para acrescentar ao nosso grupo, que já era bom e qualificado. A equipa técnica também é muito boa, dá confiança e liberdade, dentro daquilo que é preparado para cada jogo.
- Já foi solicitado em várias posições, seja na esquerda ou direita, mais atrás ou mais à frente... Está disponível para ajudar onde for preciso?
- Sim, sim. Estou preparado para qualquer posição. O importante é jogar. Sei onde posso render mais, mas onde o mister precisar, estarei sempre disponível e preparado. É por isso que trabalho durante a semana, para fazer a diferença durante os jogos.
- O último jogo foi de muitas emoções. Estavam a perder aos 90+6 minutos, mas ainda conseguiram dar a volta. Isso revela a vossa mentalidade?
- Esse jogo é o espelho do que é o nosso grupo, daquilo que temos vindo a fazer dentro e fora de campo. Acreditamos sempre. Como escrevi na legenda de uma foto: "Só acaba quando o árbitro apita". Independentemente de ser início, meio ou fim, fizemos o que estava planeado e, com a nossa crença e garra, fomos em busca do resultado. Isso é que é ser Tondela: nunca desistir e nunca baixar a cabeça.
"Subida? Sonhar é de graça"
- Esta pausa foi importante para recarregar energias?
- A pausa é interessante para descansar um pouco. Claro que queríamos estar na Taça, mas temos de tirar o lado positivo. Fomos eliminados, e isso serviu para manter os pés no chão e abrir os olhos. Tem o seu lado negativo, mas foi importante para crescer como pessoa e atleta, para continuarmos nesta sequência.
- O Pedro cumpre a 2.ª época na Liga 2. Como avalia a sua competitividade?
- Sendo sincero, a cada ano torna-se mais difícil. Ainda não perdemos, o que é um bom sinal, o trabalho está a ser bem feito. O próximo jogo é contra o Benfica B, e a concentração está toda no Benfica B.
- Os adeptos do Tondela andam entusiasmados. Eles podem sonhar com a subida?
- Sonhar, toda a gente sonha. É de graça (risos). Mas o que peço é que andem ao nosso lado, com os pés no chão e humildade. No final, pode dar certo, mas peço que a concentração esteja no Benfica B.
- Já disse que não vai revelar a sua meta pessoal. Mas parece-lhe bem o registo de quatro golos e uma assistência? Está satisfeito?
- Não estou satisfeito a 100%, mas estou muito feliz pelo nosso início. Para ter estes números, dependo da minha equipa. Somos um coletivo, mas vamos em busca de mais.
- O Tondela permitiu que o Pedro desse o salto para o profissional… Cresceu muito nestes últimos 15 meses?
- Como pessoa, principalmente, tenho mais responsabilidade e mais visibilidade. Isso fez-me crescer profissionalmente. Estive com o Gabriel Souza na AD Sanjoanense, e ele disse que me viu como uma pessoa e um jogador completamente diferentes. A época passada creio que foi de adaptação para mim, o que fez com que agora estivesse a colher frutos.
- O que há ainda para melhorar no seu jogo para alcançar novos patamares na carreira?
- Temos sempre coisas a melhorar: taticamente, fisicamente e tecnicamente. Ninguém é perfeito.
- O histórico de Tondela é de crescimento e de muita luta. Vocês falam internamente na possibilidade de subida?
- Os 18 clubes pensam na subida, mas só dois sobem, podendo o terceiro também. É jogo a jogo, num campeonato difícil, com várias equipas muito boas. Não adianta pensar muito à frente, sendo que o futuro depende do presente.
- O que nunca vai faltar à equipa do Tondela? O que o mister Luís Pinto vos pede?
- Humildade, saber ler o jogo, o momento de atacar e defender, e nunca desistir, independentemente do jogo estar mais para eles ou para nós.
- Sente que já olham para o Tondela de forma diferente?
- Pelos vários anos que o Tondela teve na Liga, é sempre bom jogar contra o Tondela. Sinto isso, que as equipas dão um gás a mais quando jogam contra nós. E agora, pelo facto de estarmos invictos, eles vão querer ser a primeira equipa a derrotar o Tondela. Vamos trabalhar forte para que isso não aconteça.
"Não conhecia nada de Portugal, mas aceitei a realidade"
- O Pedro é natural de Bacabal, no Maranhão. Como recorda o seu início no futebol? Foi difícil chegar a Portugal?
- Saí do Maranhão com 13 anos. A partir daí, nunca mais voltei a morar lá. Passei cinco anos no Sport, dos sub-17 ao profissional, depois três meses no Ferroviária e no Figueirense em 2021, e vim para o Maia. Não conhecia nada de Portugal, nada. Recebi uma proposta, é Europa, e vamos embora. Vi uma realidade completamente diferente da que vivia, mas aceitei a realidade em que estava e continuei a trabalhar. Graças a Deus, estou a colher frutos do que fiz.
- O que sentiu de mais diferente?
- Portugal é muito tático; fisicamente também tem mais intensidade. É preciso pensar mais o jog e é muito competitivo.
- Como é que os seus amigos do Bacabal estão a olhar para o seu momento? Orgulhosos?
- Recebo sempre muitas mensagens. Já recebi três prémios de homem do jogo e quando publicava nas redes sociais eles diziam: 'De novo?' (risos). Estão bastante felizes, sempre a mandar mensagens positivas, sempre a perguntar se vou jogar em tal clube, em tal clube… O que penso é que vivo o Tondela, o meu foco está aqui, e o futuro a Deus pertence.
- Dá para perceber que tem muito orgulho nas raízes. A dona Sheyla Rakel (mãe) está orgulhosa?
- O sonho é meu e da minha mãe. Ela está muito feliz e muito orgulhosa. Tanto ela como a minha filha, só que a minha filha é de Recife. Ainda é bastante pequena, mas compartilho a minha felicidade com ela; quando marco, dedico para ela. É muito bom ver o sorriso no rosto dela. E, principalmente, a minha mãe. Estende a camisola na frente da TV em dia de jogo, coloca a Bíblia e estamos sempre em conexão para que tudo dê certo.
- Ela já arranjou espaço para todos os prémios?
- Já lhe disse que tem de arranjar espaço para colocar tudo. Tenho a certeza de que vão vir muitos mais.
- Com o que ainda se sonha aos 25 anos?
- Sonhar, eu sonho, mas primeiro quero fazer a minha vida, dar uma vida confortável e merecedora para a minha mãe e filha. O futuro depende do presente, por isso vou trabalhar muito no Tondela para ter um futuro brilhante pela frente.
"Tenho o sonho de voltar ao Sport"
- Permita-me fazer aquilo um pequeno desvio até ao Brasil, onde muitos portugueses estão em grande destaque no Brasileirão, como o Abel Ferreira (Palmeiras) e Artur Jorge (Botafogo), que estão na luta pelo título. Qual a sua opinião?
- A questão do futebol é muito tática e intensa; os portugueses cobram muito a intensidade e olham muito para a parte tática. Hoje em dia, o futebol é mais estudado. Muitas equipas e seleções favoritas não ganham com facilidade, porque também é um futebol físico, tático e estudado. Vejo que eles estão a ter resultados e a perceber onde está a fonte para obter esses resultados. Caixinha, Abel, Artur Jorge, Jorge Jesus, e hoje temos o Pepa no Sport Recife, num clube pelo qual eu torço muito.
- Por falar nisso, o que espera do Sport Recife, agora com o mister Pepa?
- Espero que subam para a Serie A, onde merecem estar. É um clube muito grande, provavelmente o maior do Nordeste. Torço mesmo de coração; passei cinco anos, vivo o clube e tenho o sonho de poder voltar, jogar e fazer uma carreira brilhante, onde tenho muitos amigos. Espero que possa terminar o ano com a subida.
- Quem sabe se este ano não festeja duas subidas...
- Seria perfeito. Mas lá acaba primeiro, por isso quero festejar primeiro o título do Sport. Aqui vamos jogo a jogo (risos).
"Muita gratidão pelo Tondela"
- O que o Pedro de hoje diria ao jovem Pedro de 13 anos?
- Muito orgulho em tudo o que passei, que só eu, minha mãe e Deus sabemos. Algumas coisas nem a minha mãe sabe, tudo o que passei longe de casa.
- Foi difícil lidar com as saudades?
- Já pensei em desistir quando estava no Sport, quando as coisas não estavam a correr bem, mas Ele nunca me deixou desistir. Também aconteceu num momento recente, quando estava na AD Sanjoanense. Não sabia do meu futuro; só sabia que não ficava na Sanjoanense, mas não sabia o que viria a seguir. Foi uma semana e meia muito difícil. Chorei bastante, com saudades de casa, e senti-me sozinho. Orava a Deus. Quando assinei o contrato aqui, percebi o porquê de ter voltado mais cedo para Portugal.
- Sente-se grato ao Tondela?
- Muita gratidão ao Tondela. Sei que foi o meu trabalho ficar aqui, mas tenho gratidão pela oportunidade e por todos aqueles da cidade.
- É muito abordado na rua?
- Na época passada, nem tanto; esta época, sim. Dou sempre atenção (às pessoas), porque sei o que é estar daquele lado.
- Última pergunta: o que seria bom que se dissesse sobre o Pedro no final da temporada?
- Foi uma figura importante na época 2024/25 e creio que já fiz uma história no clássico. A primeira vitória e marcar dois golos, sendo o homem do jogo, já foi um marco. Sonhei acordado com isso. Graças a Deus, fui abençoado. No final da época, quero ser lembrado no Tondela como uma pessoa de caráter, humilde, com compromisso e sempre responsável. Tenho mais um ano de contrato e estou muito feliz.