Análise: Bom registo defensivo do Boavista enfrenta o maior teste de sempre
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Para dar contexto ao atual momento do Boavista, torna-se quase obrigatório recuar no tempo em modo flashback, até porque não há outra maneira de o dizer: desde que desceu aos campeonatos amadores, o Boavista nunca esteve tão mal como agora.
Quando voltou à Liga Portugal, sob o comando de um inexperiente Petit e com um plantel modesto, o Boavista fez pela vida e lutou pela sobrevivência, mostrando desde logo a alma que tantas vezes nos lembra o Boavistão.
A chegada de Gerard López, investidor espanhol-luxemburguês conhecido pela sua passagem por clubes como Lille, Bordéus e Servette, mas também pela Fórmula 1, quando foi presidente do conselho de administração da Lotus F1, trouxe esperanças renovadas ao Bessa.
O Boavista era, nessa altura, uma espécie de clube adormecido. É certo que a equipa não voltou a descer de divisão, mas sentiu sempre dificuldades para dar um passo em frente.
Em 2020/21, o clube investiu na contratação de nomes consagrados, como Javi García e Adil Rami, e trouxe jovens promessas, destacando-se desde logo a chegada de Angel Gomes, por empréstimo, e do norte-americano Reggie Cannon, mas os ventos da mudança não se fizeram sentir. Uma vez mais, o Boavista teve dificuldades para continuar na Liga Portugal, acabando no 13.º lugar, registo idêntico ao da época de regresso.
As expectativas criadas à volta do Boavista nunca foram cumpridas e, aos poucos, o clube começou a dar passos atrás.
Fazendo fast forward para as últimas temporadas, pelo Bessa surgiram vários relatos de salários em atraso, falhas do controlo salarial da Liga e, por fim, a proibição de inscrever jogadores na Liga Portugal, o que fez com que o plantel axadrezado fosse, pouco a pouco, perdendo qualidade.
Reisinho adiou o problema
Na época passada, o perigo da descida de divisão foi maior do que nunca. Numa época marcada pelos tais problemas financeiros, que provocaram mesmo greves na estrutura boavisteira, o clube viu o play-off de despromoção a segundos de se tornar realidade. Só que, um golo de Miguel Reisinho, aos 90'+10, alterou o destino negro do clube.
Aquele penálti celebrado pelos quase 20 mil adeptos presentes no Estádio do Bessa quase fez esquecer o que se passou nessa temporada, mas não foi suficiente para preparar os adeptos para o que aí vinha.
Fary assumiu o lugar de presidente no final dessa época e adotou um discurso realista, mas ainda assim não o suficiente para preparar os adeptos para 2024/25.
Portas do mercado só para sair
Apesar de ter apresentado duas contratações - Ibrahim Alhassan e Bruninho -, a resolução para os problemas financeiros do Boavista nunca apareceu e a equipa axadrezada viu-se obrigada a dispensar os jogadores, uma vez que não os podia inscrever na Liga.
Uma vez mais, a prata da casa teria de servir como contratação para um novo treinador, o italiano Cristiano Bacci, que sabia, à partida, a missão exigente que iria ter no Estádio do Bessa.
Obrigado a vender para fazer face às despesas da temporada e pagar algumas das dívidas que impedem o desenvolvimento do clube, o Boavista fez 2,5 milhões de euros em vendas - Pedro Malheiro para o Trabzonspor e Chidozie para a MLS - e perdeu jogadores importantes a custo zero - Makouta e Bruno Lourenço, que rescindiu alegando salários em atraso.
Todas estas mexidas retiraram qualidade e profundidade a um plantel que passou a ser um dos mais novos da Liga Portugal (média de idades de 23,89) e cuja principal figura é o eslovaco Róbert Bozeník, que já tinha estado na porta de saída no inverno passado.
Missão impossível?
Atendendo à forma como os restantes clubes recorreram ao mercado de transferências, o Boavista entrou na nova temporada como claro favorito à descida de divisão.
Com vários problemas para resolver fora das quatro linhas, o grupo às ordens de Bacci focou-se no mais importante para o clube, a manutenção.
Não se pode dizer que as primeiras quatro jornadas da temporada foram brilhantes, longe disso, mas a verdade é que a catástrofe esperada antes do arranque do campeonato, frente ao Casa Pia, acabou por não acontecer, pelo contrário.
Sem grandes armas ofensivas, Bacci montou uma equipa pragmática e focada em não sofrer golos, atingindo, neste aspeto, números que fizeram lembrar outros tempos mais felizes para os lados do Bessa.
O saldo pontual acaba por ser positivo - quatro pontos em quatro jornadas -, mas o que surpreende é o registo defensivo, o melhor desde o regresso à Liga Portugal. A equipa de Bacci terminou dois jogos sem sofrer golos (menos um do que em toda a temporada passada) e sofreu apenas um golo em quatro jornadas, registo idêntico ao da temporada 2003/04.
Boavisteiro não tem descanso
Quando o cenário parecia bem melhor do que seria inicialmente esperado, a casa boavisteira voltou a abanar. João Gonçalves, guarda-redes internacional sub-21 português que vinha sendo um dos destaques do clube neste início de temporada, sofreu uma rotura de ligamentos e terá de ser operado. Luís Pires, suposta alternativa ao guardião de 23 anos, teve a mesma lesão, exatamente no mesmo treino.
E eis que, quando o registo defensivo do Boavista parecia ser suficiente para sonhar com a manutenção, os adeptos axadrezados, que já lamentavam a lesão de Miguel Reisinho, viram-se novamente em apuros.
A contratação de César, guarda-redes brasileiro que já passou pelo Flamengo e que só conseguiu ser inscrito por ter terminado contrato com o Boavista na época passada, funciona como mais uma manobra de um clube habituado a conduzir por estradas cada vez mais estreitas.
Tomé Sousa, de apenas 17 anos, poderá jogar contra o Estrela da Amadora, batendo assim o registo de Rui Patrício de guarda-redes mais jovem de sempre a jogar na Liga Portugal.
Conseguirá a Pantera sobreviver a mais uma temporada na elite? Não há grandes dúvidas de que este será o teste mais duro desde o regresso à Liga Portugal.