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Balanço da Liga: Duarte Gomes exalta comunicação arbitral mais aberta

LUSA
Duarte Gomes, antigo árbitro
Duarte Gomes, antigo árbitroDuarte Gomes/Facebook
A explicação em tempo real das decisões tomadas pelos árbitros de campo com recurso ao videoárbitro (VAR) foi um passo relevante na segunda metade da Liga de futebol 2023/24, enaltece o antigo ‘juiz’ internacional Duarte Gomes.

Como existia algum receio, porque ainda não se sabia muito bem a reação das pessoas perante uma conversa ouvida literalmente ao vivo, deu-se um primeiro passo de maneira sensata. No fundo, é um pequeno bombom, seja para quem está a ver o jogo em casa e paga por isso, seja para quem está no estádio e quer perceber o que é que aconteceu e aquilo que estava em causa num determinado lance”, notou à agência Lusa o ex-árbitro.

Em janeiro, o Conselho de Arbitragem (CA) da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) teve autorização da FIFA e do International Board (IFAB), entidade reguladora das regras do futebol, para erguer a possibilidade de, nas competições nacionais em que o sistema VAR está contemplado, um ‘juiz’ principal explicar ao público em tempo real uma decisão tomada, através da instalação sonora dos estádios e da respetiva transmissão televisiva.

Isto vai ter uma grande vantagem: por muito que as pessoas discordem das decisões e possam ficar chateadas, perceberão que não houve nenhum processo de premeditação nem de prejuízo intencional. Pela fluidez dessa conversa, vão entender que aquilo que o árbitro e o VAR disserem é genuinamente o que estão a pensar sobre um lance”, frisou.

Quatro meses antes da adoção dessa ferramenta, que já existe em outras modalidades, como o râguebi, as comunicações dos jogos da I Liga começaram a ser difundidas num programa televisivo mensal, tendo Duarte Gomes enaltecido outro dos passos do CA da FPF para “elevar a transparência de processos, aproximar adeptos e credibilizar o setor”.

Se já estaria na hora de avançar? Penso que sim. Por exemplo, não deixar passar tanto tempo em relação aos lances, porque estamos a falar de um programa mensal e, muitas vezes, aborda-se algo que as pessoas até já não se lembram. Perde-se impacto e efeito junto do público, que quer ser saciado no dia seguinte ou 48 horas depois da partida. Em outros países, já há essa abordagem ao fim de pouco tempo. Por muito que as pessoas ainda estejam algo a quente, conseguem, pelo menos, entender o que aconteceu”, disse.

Portugal foi um dos pioneiros na divulgação dos áudios e no próprio lançamento do VAR, um sistema tecnológico aprovado em 2016 pelo IFAB, que recorre a imagens vídeo para auxiliar as equipas de arbitragem à distância, estando em vigor na Liga desde 2017/18.

Há um conjunto de situações em que o VAR inequivocamente traz mais-valias, mas este processo requer habilidade do condutor. Ainda estamos na fase de apurar os árbitros que conseguem transitar bem para uma sala, realizar um trabalho de análise completamente diferente daquilo que têm em campo e adaptar-se bem. Isto pede competências inatas e habilidade para comunicar com os colegas, suportar a pressão de formas distintas e ser rápido e eficaz. Nem todos reúnem essas valências e acho que é muito por aí que ainda vemos alguns erros que entendemos que não são perdoáveis”, observou Duarte Gomes.

O protocolo prevê auxílio na deliberação de quatro situações - golos, cartões vermelhos, penáltis e identidade disciplinar trocada -, mas o antigo ‘juiz’ da associação de Lisboa, de 51 anos, projeta uma “inversão de tendência, que não será necessariamente de prejuízo para o jogo”, no uso do VAR, esta época estendido à Liga 2 e à Liga feminina.

Há um equilíbrio difícil de fazer e não me espantaria muito se, no futuro próximo, houver um protocolo que só vai permitir a intervenção em situações de exceção absolutamente claríssimas e factuais, ainda mais do que aquelas que vemos agora. Esta tendência já foi passada a quem estará no Europeu: o árbitro de campo é o chefe de equipa, o dono do jogo, e deve decidir a esmagadora maioria dos lances”, finalizou o comentador televisivo.

Balanço positivo

A arbitragem portuguesa teve um trabalho proveitoso na Liga 2023/24, vinca o antigo juiz internacional Duarte Gomes, apesar de sentir uma “pequena turbulência na fase inicial”, que ocasionou “maior ruído do que o habitual”.

A esmagadora maioria das decisões foi correta, mas também vimos situações - algumas delas mediatizadas - com erros, que apenas mostram que a arbitragem é uma daquelas atividades que nunca poderá parar de trabalhar e de tentar continuadamente aumentar a consistência das suas decisões e a eficácia de atuação. De maneira geral, foi uma época positiva, sendo certo que há coisas para evoluir”, enquadrou à agência Lusa o ex-árbitro.

Uma das polémicas mais badaladas sucedeu logo à segunda jornada, quando o primeiro golo da vitória tangencial do novo campeão nacional Sporting na visita ao Casa Pia (2-1), em Rio Maior, foi validado de forma incorreta pela equipa de arbitragem comandada por Nuno Almeida, já que o avançado Paulinho estava em fora de jogo por nove centímetros.

É algo que não é normal: houve um erro humano numa situação factual. Não estamos a falar de lances de interpretação, visto que havia uma tecnologia que suportava a 100% a decisão correta. Aí, o Conselho de Arbitragem (CA) da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) teve uma postura no imediato que me pareceu correta: sendo um lance objetivo e visto por toda a gente, fez o reconhecimento de que tinha havido um erro na definição da linha tecnológica de fora de jogo por parte da equipa de videoarbitragem (VAR)”, indicou.

O polémico golo de Paulinho
O polémico golo de PaulinhoSporttv

Duas rondas depois, já na reta final do jogo FC Porto-Arouca (1-1), o sistema tecnológico de imagens vídeo para ajudar os árbitros de campo à distância teve uma falha energética de 14 minutos, fase na qual Miguel Nogueira reverteu um penálti sobre o portista Taremi.

Ao minuto 90+6, quando os ‘lobos’ ganhavam por 1-0 no Dragão, o ‘juiz’ deslocou-se ao monitor para conferir as imagens desse lance, mas deparou-se com alegados problemas técnicos e teve de recorrer à via telefónica para contactar com Rui Oliveira, o VAR desse jogo, antes de chamar os treinadores de cada equipa para transmitir a sua decisão final.

As pessoas não sabiam que já havia um plano B para o caso de a comunicação falhar e poder entrar como recurso o tal telemóvel que estava credenciado para o efeito. Foi mais especulação por desconhecimento do que uma falha, porque esta aconteceu no sistema, mas não no plano da arbitragem. A decisão correta foi tomada, o que é elogiável”, notou.

Essa foi a partida com mais tempo de compensação na Liga, ao registar 25 minutos, 22 dos quais na segunda parte, momento em que, após o penálti revertido a Taremi, Galeno desperdiçou novo castigo máximo, aos 90+15, e Evanilson impôs o 1-1 final, aos 90+19.

Os árbitros começaram por levar à letra as instruções que receberam para serem muito mais rigorosos na contagem das paragens, que poderiam, depois, levar a mais tempo de descontos. Entretanto, e parece-me que muito bem, existiu uma inversão de estratégia, porque se percebeu claramente que havia um exagero. Ou seja, tínhamos embates com mais do que uma parte de prolongamento e isto não é razoável”, ilustrou Duarte Gomes.

Logrado um “ponto de equilíbrio muito justo”, que levou a uma média de 9,46 minutos de compensação nos 306 duelos da prova, o antigo árbitro da associação de Lisboa, de 51 anos, exalta a queda gradual do número de faltas e a percentagem média de 54,95% de tempo útil de jogo, mas pede contributos globais na evolução constante desses registos.

Os árbitros não conseguem resolver este problema sozinhos. Se cada equipa optar por uma abordagem de maior desportivismo e com menos quedas falseadas, simulações de lesões, perdas de tempo deliberadas nas bolas paradas ou demoras nas substituições, o jogo também terá muito mais tempo útil a contar. Isto é um esforço coletivo. Não estando num ponto ideal, a parte dos árbitros já evoluiu bastante”, frisou o comentador televisivo.