Sporting campeão: Amorim pauta rápida ascensão com personalidade e modelo tático maturados
À quarta época feita do princípio ao fim em Alvalade, o ex-médio internacional português, de 39 anos, sucedeu ao inglês Randolph Galloway como primeiro técnico a bisar desde 1951/52 pelo clube lisboeta, reflexo da dimensão histórica do 20.º título verde e branco.
Rúben Amorim chegou ao sexto cetro em outras tantas temporadas nos bancos, e quinto pelo Sporting, no qual arrebatou também duas Taças da Liga (2020/21 e 2021/22) e uma Supertaça Cândido de Oliveira (2021), reerguendo um clube talhado para a instabilidade.
A meta falhada do bicampeonato - que já foge aos leões há 70 anos -, em 2021/22, bem como o quarto lugar na última edição da Liga Portugal, com a consequente ausência da Liga dos Campeões, fizeram aumentar a pressão do treinador, que foi moderando alguma da sua intempestividade e burilou as dinâmicas do habitual 3-4-3 para voltar ao trono nacional.
Amorim vai devolvendo com juros os 10 milhões de euros (ME) investidos pelo Sporting em março de 2020, quando, perante o ceticismo de adeptos e imprensa, reagiu logo em pleno dia da sua apresentação com uma tirada desarmante e auspiciosa, que virou gíria em Alvalade: “As pessoas perguntam: ‘E se corre mal?’. Eu pergunto: ‘E se corre bem?’”.
Insistentemente associado nas últimas semanas ao radar da Premier League, o ex-médio vai tentar melhorar o recorde de pontuação (86) e de vitórias (27) do clube numa edição da Liga e fechar a época com a primeira dobradinha em 22 anos dos leões, que defrontam o FC Porto na final da Taça de Portugal, em 26 de maio, no Estádio Nacional, em Oeiras.
Esse é o último passo para que Rúben Filipe Marques Diogo Amorim, nascido em 27 de janeiro de 1985, em Lisboa, complete o palmarés nacional nos bancos e repita os quatro troféus vencidos com o Benfica de 2008 a 2015, no auge do seu percurso como jogador.
O clube da Luz, do qual era adepto desde miúdo, acomodou as suas primeiras etapas no futebol - entre uma aventura efémera no hóquei em patins -, seguindo-se CAC Pontinha, Ginásio de Corroios e Belenenses, através do qual se estreou como sénior, em 2003/04.
Duas épocas de afirmação sob alçada de Jorge Jesus motivaram o Benfica a investir um ME na contratação de Rúben Amorim, em 2008/09, passo tomado pelo atual técnico dos sauditas do Al-Hilal no exercício seguinte, com essa dupla a cooperar na conquista de 10 troféus, incluindo três campeonatos (2009/10, 2013/14 e 2014/15), além da final da Liga Europa perdida no desempate por penáltis frente aos espanhóis do Sevilha, em 2013/14.
Brincalhão fora de campo, mas sem descurar fortes convicções nos treinos e jogos, o ex-médio chegou a ter desavenças com Jorge Jesus e foi emprestado ao SC Braga, celebrando uma das seis Taças da Liga do seu currículo como jogador (2012/13), no qual constam 14 jogos pela seleção nacional, que representou nos Mundiais de 2010 e 2014.
O regresso ao Benfica acentuou um histórico de lesões e cirurgias nos joelhos e baixou a sua influência nos relvados, originando uma cedência ao Al-Wakrah (2015/16), do Catar, antes de longos meses de inatividade e do final da carreira em 2017, então com 32 anos.
Depois de 18 tentos em 337 partidas, começou a formar-se como técnico e lançou-se em 2018/19 pelo Casa Pia, do qual se demitiu ao fim de meio ano, após ter sido punido pelo Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol por ter dado indicações em partidas como estagiário - decisão anulada mais tarde pelo Tribunal Arbitral do Desporto.
Os gansos subiram à Liga 2 e até conquistaram o Campeonato de Portugal, patamar ao qual Rúben Amorim regressaria em setembro de 2019 para liderar o SC Braga B até dezembro, altura em que, já com o segundo nível, rendeu Ricardo Sá Pinto na equipa principal e teve uma estreia vigorosa na Liga, pontuada pela conquista da Taça da Liga.
Essa vertiginosa projeção levou o Sporting a contratar o quarto treinador em 2019/20 e o sexto na presidência de Frederico Varandas, impondo então o terceiro negócio mais caro de sempre nos bancos, que, com atrasos no seu pagamento, mais IVA, subiu a 14,4 ME.
O sucessor de Jorge Silas foi incapaz de evitar a ausência do pódio na Liga Portugal, um recorde de derrotas na mesma campanha e o maior jejum de campeonatos na história do clube, enquanto montava as bases para catapultar a competitividade leonina e valorizar ativos.
Com 32 jogos seguidos sem perder e uma derrota, Amorim tirou partido de um calendário aliviado pela precoce saída da Liga Europa e as curtas expectativas, trocando a angústia pelo êxtase no universo verde e branco com o primeiro campeonato desde 2001/02, sob chancela da própria formação, mas sem adeptos em redor, face à pandemia de covid-19.
Se o discurso realista obstruiu uma candidatura declarada ao título em 2020/21, o padrão exibicional e o melhor planeamento do plantel permitiu-lhe agora enfrentar com confiança uma “época de tudo ou nada”, na qual passou a segundo treinador com mais jogos (210), vitórias (146) e troféus pelo Sporting, sob pena de quebrar o vínculo extensível até 2026.
O fim da renitência em recrutar um ponta de lança com o perfil do sueco Viktor Gyökeres, melhor marcador da Liga Portugal, com 27 tentos, deu força a um coletivo incisivo em transições, de relação fácil com o golo - 136 em 51 jogos nas diversas provas - e incapaz de deixar cair quem jogava pouco, sem dispensar ajustes estratégicos ao modelo tático de sempre.