Entrevista Flashscore a Marcelo (Dibba Al Fujairah): "Torço pelo Rio Ave, estou triste pelo Paços de Ferreira"
Para trás ficaram onze temporadas no futebol português, do Ribeirão ao Paços de Ferreira, com sete épocas no Rio Ave e uma passagem pelo Sporting. Marcelo continua a acompanhar de perto o campeonato nacional, mostra-se satisfeito com a temporada tranquila do Rio Ave no principal escalão e, ao mesmo tempo, a torcer para que o Paços de Ferreira consiga enganar o destino a assegurar a manutenção. Ao Sporting reserva também elogios, desde a forma como foi tratado ao futebol que a equipa de Rúben Amorim pratica, deixando claro que o futuro passa por um regresso a Portugal, com ou sem as botas calçadas. Porque, assume o próprio na entrevista ao Flashscore, já se sente mais português que brasileiro.
- Primeira temporada no Dibba Al Fujairah, dos Emirados Árabes Unidos. Como está a ser essa experiência?
- Estou a gostar muito de estar aqui. No ano passado estive na Arábia Saudita, os Emirados é um pouco diferente mas gosto muito da cultura. Já estou totalmente adaptado e integrado. Gosto muito.
- As pessoas têm por hábito olhar para o futebol dessa parte do globo com alguma desconfiança. É assim tão diferente ao que o Marcelo estava habituado na Europa?
- É um pouco diferente, principalmente no verão. O clima aqui é muito diferente, jogamos muitas vezes com mais de 40 graus, mesmo à noite. É um clima totalmente diferente, o futebol é muito mais parado, não tem a intensidade como a Europa nem tem como isso ser possível.
- É um choque para vocês, habituados ao andamento do futebol europeu?
- Com certeza. Quando se chega sente-se logo o clima, logo quando se entra em campo. Demora algum tempo a habituar-se. Por isso digo que é essencial chegar, fazer uma boa pré-temporada porque chegar aqui da Europa e começar a jogar é mesmo muito difícil.
- É um tipo de futebol que está a atrair cada vez mais jogadores de topo. A vertente financeira é a única explicação para isso?
- Claro que o mais importante é a parte financeira, todos os jogadores vêm para cá por isso, senão não viriam. Mas também a qualidade de vida é muito boa, principalmente aqui nos Emirados Árabes Unidos. Moro a uma hora do Dubai, sempre que posso vou lá. E também a parte familiar, aqui há menos jogos, apenas uma vez por semana. É impensável jogar aqui duas vezes por semana, acontece muito raramente.
- A ida de tantos jogadores para essa zona do globo, nomes grandes, está a ajudar a evoluir a qualidade do futebol nesses países?
- Claro que sim. Aqui nos Emirados tem grandes nomes, na Arábia também tem grandes nomes, como o caso agora do Cristiano Ronaldo e agora até se fala no Messi. Isso chama a atenção dos outros jogadores. Se os melhores do Mundo vêm para cá, alguma coisa boa deve ter. Antigamente olhavam para cá como países muito fechados mas hoje em dia não é assim, a mentalidade é totalmente aberta.
- Nos Emirados Árabes Unidos notam o impacto da ida de Cristiano Ronaldo para a Arábia Saudita? Esse impacto chega aí, aos clubes, aos futebolistas mais jovens?
- Claro que se nota. Ao início nem ninguém acreditava. Nem mesmo eu acreditei que o Ronaldo vinha para a Arábia. Só quando chegou ao aeroporto e assinou o contrato. Agora que veio o Cristiano Ronaldo começam a aparecer muitos nomes. Aqui nos Emirados temos o Pjanic, tem o Paco Alcácer, tem grandes nomes aqui. A vinda de grandes nomes atrai outros grandes nomes.
- E isso provoca impacto positivo nas competições mas também aumenta o interesse do público, sobretudo os mais jovens, para a prática da modalidade. Sente-se o aumento do número de praticantes?
- Com certeza. Isso atrai muita coisa, até as transmissões televisivas. Era impensável ver um jogo da Arábia Saudita transmitido em Portugal. Isso hoje já acontece graças ao Cristiano Ronaldo. E isso atrai consigo outros investimentos, eles querem também mostrar que o país está a abrir-se, podem vir outros jogadores que serão bem-vindos. Antigamente quem vinha para a Arábia diziam que nem podia sair de casa, que não ia conseguir viver. E não tem nada a ver.
- Tivemos também o Mundial no Catar, no final do ano passado, e fala-se num Mundial na Arábia Saudita. O que se tem falado por aí sobre o assunto?
- Quando eu estava na Arábia Saudita já se falava nisso. É uma questão de ciúmes. O Catar é um país pequeno, a Arábia Saudita é um país muito maior e tem uma seleção muito maior. Com certeza eles também querem organizar um Mundial.
- E é possível a Arábia Saudita organizar um Mundial?
- Claro que sim. Estão a investir muito, até no turismo. Colocaram o Messi como embaixador do turismo da Arábia Saudita. Colocam grandes nomes para chamar mais a atenção. Eles apostam nisso a pensar no Mundial.
- É uma estratégia política levar grandes nomes do futebol para convencer a FIFA?
- Claro. Estão a reformar os estádios todos, a melhorar as condições no país. Esse é o grande marketing deles.
- O Marcelo foi formado no Vasco, chegou em 2010 a Portugal para jogar no Ribeirão, uma época depois o Rio Ave, com empréstimo ao Leixões. Sete temporadas em Vila do Conde, o salto para o Sporting, o empréstimo ao Chicago Fire e mais dois anos no Paços de Ferreira. Mantém os laços com Portugal?
- Com certeza. A minha família é portuguesa, a minha mulher é portuguesa. Aqui vamos ter o último jogo e depois vou direto para Portugal, antes de ir para o Brasil.
- Continua a acompanhar a Liga Portuguesa?
- Continuo. Assisto sempre, tenho os canais em minha casa. Vejo sempre os jogos, tenho acompanhado o campeonato, sobretudo as equipas por onde passei. Sempre que posso, sempre que os horários não coincidem com os meus jogos, assisto sempre.
- O Rio Ave, o clube com que mais se identifica, teve ali uma travessia no deserto, com a descida de divisão, voltou e estabilizou agoa na Liga. Como vê o futuro do Rio Ave?
- Estou feliz com o que tenho visto do Rio Ave. O principal objetivo era a manutenção e foi o que fizeram. Tem feito um campeonato tranquilo. A minha família é de Vila do Conde, fico feliz por ver o Rio Ave na primeira divisão. Torço muito pelo Rio Ave e, ao mesmo tempo, estou triste pelo Paços de Ferreira. É uma pena estar nesta situação, torço muito que consiga a manutenção. As pessoas de Paços merecem estar na primeira divisão.
- São dois clubes especiais para si?
- É verdade. São cidades que acolhem muito os clubes. Seria uma pena ver o Paços descer. O Rio Ave está seguro, gostava que o Paços também ficasse.
- Também passou pelo Sporting, onde não jogou tanto. Também é um clube especial para si?
- Depois de Rio Ave e Paços de Ferreira, tenho um carinho muito grande pelo Sporting. Fui muito bem tratado lá, agradeço o que as pessoas fizeram por mim, ainda mantenho o contacto com algumas pessoas que trabalham lá, até com alguns jogadores. O Sporting não condiz com a classificação, é das equipas que melhor joga futebol em Portugal. Mas no futebol nem sempre ganha quem joga melhor.
- O Marcelo tem 33 anos. A carreira é para terminar aí ou equaciona um regresso a Portugal?
- Quero ficar mais um ou dois anos aqui e depois gostava de terminar a carreira em Portugal, sim. Voltar para um clube português e depois continuar a viver em Portugal. Já não me vejo a viver no Brasil. Como estive muitos anos em Portugal acostumei-me, tenho muitos amigos, família... Tenho mais amigos em Portugal do que no Brasil. Posso dizer que sou mais português que brasileiro.