Guilherme Fernandes: "Tenho o sonho de fazer a estreia no Benito Villamarín"
Em agosto de 2023, Guilherme Fernandes conversava com o Flashscore sobre o início do desafio no Real Betis. Catorze meses depois dessa entrevista, o guarda-redes português continua de sorriso bem estampado no rosto.
Além de estar a adorar viver na "incrível" cidade de Sevilha, o jovem guardião assumiu-se como indiscutível na equipa secundária dos verdiblancos, tendo subido de escalão, e continua, a espaços, a trabalhar com a equipa principal liderada pelo icónico Manuel Pellegrini, bebendo dos ensinamentos do espanhol Adrián San Miguel e do compatriota Rui Silva.
"A intensidade é brutal"
- O Guilherme falou connosco em agosto de 2023, quando estava a iniciar o seu trajeto no Betis. Qual é o balanço?
- O balanço é muito positivo. No início, foi difícil adaptar-me: um país novo, o facto de ter vindo sozinho e longe da minha família pela primeira vez, que é um grande apoio para mim. No entanto, foi bom para fortalecer a minha mentalidade e a maturidade, e o resultado desportivo veio ao de cima. Fiz boas exibições, recebi o carinho do clube e dos meus companheiros. Consegui ajudar na subida de divisão, e agora as coisas estão a ir muito bem também, tanto do ponto de vista individual quanto coletivo. Só quero continuar nesse nível e continuar a ajudar.
- Começou por ser emprestado, mas o Betis acionou a cláusula de opção e assinou um contrato de dois anos. O que lhe diz esta tomada de posição do clube?
- Sim, isso mostra confiança e que apreciaram o meu trabalho. É muito positivo. Trata-se de um clube gigantesco, e isso dá-me uma confiança extraordinária. Estou muito feliz, e agora quero provar em campo que eles fizeram a escolha certa.
- Em que aspetos sente que o seu jogo cresceu no Betis?
- Acima de tudo, ganhei muita maturidade a interpretar o jogo, os seus momentos, e em lidar com os erros. Quando subo para a equipa principal, com o Rui (Silva) e o Adrián (San Miguel), vejo que, quando acontece uma ação menos boa, eles não se deixam abalar e pensam logo na próxima jogada. Quando somos jovens, queremos que cada ação seja perfeita, mas a perfeição não existe. Vamos sempre cometer erros. Se ficamos presos no erro, a próxima jogada também acaba por ser afetada. Hoje, sei que vou errar e aceito isso de forma diferente. A intensidade é brutal, os reflexos ficam mais rápidos, e os guarda-redes são muito mais rápidos na leitura do jogo e nas ações.
- Nessa tal entrevista dizia que estava no início de um sonho. Pergunto se já caiu na realidade?
- Já caí na realidade. Apesar disso, ainda tenho o sonho de fazer a estreia no Benito Villamarín. E não apenas estrear, mas também tornar-me guarda-redes da equipa principal. Esse é o meu objetivo, e estou a trabalhar diariamente para alcançá-lo.
- O Guilherme tem vindo a trabalhar de forma regular na equipa principal. Que conselhos tem recebido?
- O nível é muito alto. O Rui já me ajuda desde o ano passado. Criamos uma relação muito boa. O Adrián também. Por exemplo, num dos últimos treinos, disse-me que não precisava de estar sempre a saltar, para não ser tão ativo o tempo todo. No fundo, são guarda-redes com muita experiência, que veem os mais novos e querem ajudar. Eles ajudam-me muito, e sou um sortudo por ter esses dois monstros ao meu lado.
- E qual é aquele que lhe crie mais problemas?
- Ainda não tive a sorte de treinar com o Lo Celso, mas o Vitor Roque é um craque, e dá para notar que tem ali detalhes e qualidades muito boas. Mas é um grupo com muita qualidade, até mesmo os centrais. O Diego (Llorente), por exemplo, tem uma qualidade incrível na finalização. É difícil apontar só um.
- Já teve a oportunidade de falar com o Vitor sobre o Sporting?
- Por acaso, ainda não foi um tema de conversa (risos). Dou-me bem com ele, mas nunca falámos sobre isso. Pode ser que um dia ainda venha a jogar em Portugal.
"O Betis espera que eu chegue à equipa principal"
- Subiram da 2.ª RFEF para a Primera RFEF (3.º escalão do futebol espanhol). Para quem não conhece a realidade, estamos a falar de uma liga com muita qualidade, não é verdade?
- As pessoas não têm bem noção... Já joguei aqui com 13 mil pessoas. Enchemos a cidade desportiva em quase todos os jogos. O nível é mesmo muito alto. Os estádios são incríveis, com equipas que já estiveram no topo, e jogadores com um historial incrível. Os relvados são muito bons, todos os jogos são transmitidos, o Instagram da competição tem muita visibilidade e, para nós jovens, sentimos que temos muitos olhos em cima de nós.
- A liga tem duas séries com 20 equipas cada...
- É muito forte. No nosso grupo, está tudo muito equilibrado. Não há jogos fáceis, em que entres com superioridade ou com a certeza de que vais ganhar. O nível é realmente muito alto.
- Tem sido dono e senhor da baliza da equipa B do Betis, que mensagem é que o clube lhe tem passado?
- Da parte do clube, sinto muita confiança em mim. Consegui ganhar a titularidade de forma indiscutível, mas tenho concorrência, o que me obriga a estar no meu melhor, pois há alguém com nível para ocupar o meu lugar. No entanto, sinto que o clube confia em mim e espera que eu chegue à equipa principal, o que me dá tranquilidade. Também me sinto muito acarinhado no grupo, faço parte do grupo de capitães, e sentir esse apoio do clube é muito gratificante. Sou muito grato ao Betis e farei tudo o que estiver ao meu alcance para ajudar o clube.
"Não tenho palavras para descrever o amor que tenho por ser guarda-redes"
- Quais são as principais qualidades que um guarda-redes tem de ter para sobreviver neste mundo tão competitivo?
- A liderança, ser um guarda-redes com presença e carisma. Estes são fatores muito importantes. Nós, como guarda-redes, estamos na frente e vemos o jogo todo. Portanto, ser líder e comunicativo são ferramentas essenciais. Depois, há o jogo de pés, que também é muito importante. O futebol moderno exige muito em termos de jogo de pés. Esses são elementos fundamentais para estar no topo e ser reconhecido.
- O que é fundamental para vencer o duelo um para um contra um avançado?
- Hoje em dia sabemos o que os adversários vão fazer, por isso vamos para os jogos mais preparados e conhecemos os adversários ao pormenor. Quando chega a ação, é importante manter a calma e ter a certeza de que vamos defender.
- Muitos dizem que é uma posição ingrata, com alguns momentos de frustração e sob o forte olhar da crítica. Como lidou com esses momentos ao longo da carreira?
- Há momentos que são complicados. É uma posição ingrata, mas única. Não tenho palavras para descrever o amor que tenho por ser guarda-redes. Não há jogo de futebol sem guarda-redes; pode haver sem avançados, mas não há sem um guarda-redes, e essa é uma posição única. Estamos sujeitos a críticas. Somos o último homem, e se errarmos e sofrermos um golo, temos de tentar tapar os ouvidos. É importante ignorar tanto os elogios excessivos quanto as críticas negativas. O que tenho feito é ignorar essas vozes e perceber por mim mesmo onde preciso trabalhar para calar essas bocas.
- Que conselho daria a um jovem que tem o sonho de ser guarda-redes?
- Que dêem tudo de si em cada treino e, acima de tudo, que não deixem de acreditar. Não é fácil; já passei por momentos complicados, em que passei um ano sem jogar ou a jogar apenas uma partida. Mas é importante dar o melhor em cada treino e nunca deixar de acreditar, além de nos rodearmos de pessoas que nos querem bem. A verdade é que, se estou onde estou, e ainda estou muito longe de onde quero estar, é porque tive o apoio da minha família.
"Tenho um caminho difícil para chegar à Seleção"
- Quais os objetivos a médio/longo prazo?
- O meu objetivo é chegar ao topo, e neste caso, à LaLiga, e que olhem e digam que o Guilherme deu tudo de si para alcançar o auge do futebol profissional. Quero mostrar às pessoas que estou aqui e que tenho nível para chegar ao topo. Representar a Seleção de Portugal é algo que também tenho bem presente.
- Sente que Portugal está bem servido a nível de guarda-redes?
- Estamos. Sei que tenho um caminho difícil pela frente para chegar à Seleção. Temos três grandes guarda-redes na seleção. Dou mérito ao Ricardo Velho pelo caminho que fez, de nunca ter desistido. O Diogo Costa é incrível e identifico-me muito com o estilo dele. E o meu objetivo é, daqui a uns aninhos, estar à porta a dizer que estou aqui.
- Em jeito de auto-avaliação, quais os seus pontos fortes e os aspetos que ainda sente que tem a melhorar?
- Considero-me um guarda-redes que é um líder, muito comunicativo. O meu jogo de pés é bom e, acima de tudo, o que tenho de melhorar é conseguir manter a concentração durante os 90 minutos. Por vezes, não é fácil.