Manipulação e apostas marcam o ano no futebol brasileiro e mundial: os casos e as penas aplicadas
Segundo levantamento da empresa de análise de dados Similarweb, publicado no jornal O Globo, o Brasil superou o Reino Unido em acessos a plataformas de apostas desportivas no ano passado.
Entre janeiro e dezembro de 2022, a percentagem foi de 75% nos acessos a sites de jogos e apostas no país. No final do ano passado, um estudo da plataforma Futuros Possíveis apontou que um em cada três adultos que acompanham e praticam desporto no país já haviam realizado algum tipo de aposta online.
Uma febre que não se restringiu apenas a pessoas comuns. Chegou também aos jogadores de futebol. Os responsáveis pelo espetáculo colocaram em xeque a lisura do jogo.
Como funcionava o esquema
O esquema tem como uma das peças Romário Hugo dos Santos, de 28 anos, conhecido como "Romarinho". Ex-jogador do Palmeiras, foi acusado pelo Ministério Público de Goiás de aliciar jogadores com ofertas que variavam entre 9500 e os 20 mil euros.
Os atletas previamente combinavam a execução de lances específicos durante os jogos, como receberem um cartão amarelo, um determinado número de faltas, número de cantos e até mesmo a derrota da própria equipa. Com os lances já arranjados, diversos apostadores faturavam milhões em vários sites de apostas do Brasil.
A cronologia da Operação Penalidade Máxima
O esquema foi denunciado por Hugo Jorge Bravo, presidente do Vila Nova-GO, que também é policial militar. Na época, o médio Romário, do próprio Vila Nova, aceitou uma oferta de quase 30 mil euros para cometer um penálti contra o Sport, em jogo da Série B do ano passado.
O jogador recebeu um sinal de dois mil euros, e só teria os outros 28 mil após a partida, com o penálti cometido. O jogador recebeu ameaças e reportou o esquema.
As investigações começaram em novembro do ano passado, mas a primeira fase foi levada a cabo a 14 de fevereiro deste ano. Na ocasião, a Polícia cumpriu mandados de busca e apreensão nos estados de Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso, São Paulo e Rio de Janeiro. Uma prisão temporária foi feita pelas autoridades.
Já na segunda fase da Operação, o Ministério Público e os investigadores identificaram a influência do grupo criminoso em oito partidas da Série A do Campeonato Brasileiro de 2022. No total, 16 jogos receberam denúncias, com 23 fatos criminosos a serem identificados pelas autoridades. Sete jogadores de futebol e nove apostadores tornaram-se réus na investigação.
No dia 28 de novembro, a Operação Penalidade Máxima chegou à sua terceira fase. Foram cumpridos 10 mandados de busca a apreensão nas cidades de Goiânia, Bataguassu-MS, Campina Grande-PB, Nilópolis-RJ, Santana do Parnaíba-SP, São Paulo, Volta Redonda-RJ e Votuporanga-SP.
Os jogos investigados
Palmeiras x Juventude, na Série A do Brasileirão de 2022;
Juventude x Fortaleza, na Série A do Brasileirão de 2022;
Ceará x Cuiabá, na Série A do Brasileirão de 2022;
Sport x Operário, na Série B do Brasileirão de 2022;
Santos x Avaí, na Série A do Brasileirão de 2022;
Goiás x Juventude, na Série A do Brasileirão de 2022;
Bragantino x América-MG, na Série A do Brasileirão de 2022;
Criciúma x Tombense, na Série B do Brasileirão de 2022;
Sampaio Corrêa x Londrina, na Série B do Brasileirão de 2022;
Cuiabá x Palmeiras, na Série A do Brasileirão de 2022;
Vila Nova x Sport, na Série B do Brasileirão de 2022;
Botafogo x Santos, na Série A do Brasileirão de 2022;
Portuguesa x Red Bull Bragantino, no Campeonato Paulista de 2023;
Guarani x Portuguesa, no Campeonato Paulista de 2023;
Esportivo x Novo Hamburgo, no Campeonato Gaúcho de 2023;
Caxias x São Luiz, no Campeonato Gaúcho de 2023;
Avaí x Flamengo, na Série A do Brasileirão de 2022;
Náutico x Sampaio Corrêa, na Série B do Brasileirão de 2022;
Náutico x Criciúma, na Série B do Brasileirão de 2022;
Goiânia x Aparecidense, no Campeonato Goiano de 2023;
Goiás x Goiânia, no Campeonato Goiano de 2023;
Nacional x Auto Esporte, no Campeonato Paraibano de 2023;
Sousa x Auto Esporte, no Campeonato Paraibano de 2023.
Os jogadores investigados
Allan Godói (central, Operário-PR) - Absolvido
Alef Manga (avançado, ex-Coritiba) - multa de 9500 euros e suspensão por 360 dias
André Luiz (médio, ex-Sampaio Corrêa) - multa de 9500 euros e suspensão por 600 dias
Bryan Garcia (médio, ex-Athletico-PR) - multa de 9500 euros e suspensão por 360 dias
Dadá Balmonte (médio, ex-jogador do América-MG) - multa de 12 mil euros e suspensão por 600 dias
Diego Porfírio (lateral-esquerdo, ex-Coritiba) - multa de 12 mil euros e banido da competição
Eduardo Bauermann (central, ex-Santos) - multa de 6500 euros e suspensão por 360 dias
Fernando Neto (médio, São Bernardo) - multa de 2800 euros e suspensão por 360 dias
Gabriel Domingos (médio, Vila Nova) - multa de 15 mil euros e suspensão por 720 dias
Gabriel Tota (médio, Ypiranga-RS) - multa de 9500 euros e banido da competição
Igor Cariús (lateral-esquerdo, ex-Sport) - multa de 7500 euros e suspensão por 360 dias
Jesus Trindade (médio, ex-Coritiba) - Absolvido
Mateusinho (lateral-direito, ex-Cuiabá) - multa de 9500 euros e suspensão por 600 dias
Matheus Gomes (guarda-redes, sem clube) - multa de 2 mil euros e banido da competição
Nino Paraíba (lateral-direito, ex-Paysandu) - multa de 18 mil euros e suspensão por 720 dias
Paulo Miranda (central, sem clube) - multa de 13 mil euros e suspensão por 720 dias
Paulo Sérgio (central, Operário) - multa de 9500 euros e suspensão por 600 dias
Pedrinho (lateral, ex-Athletico) - Absolvido
Romário (médio, ex-Vila Nova) - multa de 15 mil euros e banido do futebol
Sávio (lateral-esquerdo, ex-Goiás) - multa de 5500 euros e suspensão por 360 dias
Sidcley (lateral, ex-Cuiabá) - Absolvido
Thonny Anderson (médio, ex-Coritiba) - multa de 7500 euros
Vitor Mendes (central, ex-Atlético-MG) - multa de 13 mil euros e suspensão por 720 dias
Ygor Catatau (avançado, ex-Sampaio Corrêa) - multa de 13 mil euros e banido da competição
Moraes - multa de 10 mil euros e suspensão por 720 dias
Kevin Lomónaco - multa de 4700 euros e suspensão por 360 dias
Casos também no exterior
Mas não foi só no Brasil que a "casa caiu" para os jogadores que se envolveram com manipulação de jogos. Em maio deste ano, o avançado inglês Ivan Toney, um dos destaques do Brentford, foi suspenso e multado em 58 mil euros após cometer 232 violações das regras da FA sobre apostas.
O jogador, que se declarou viciado em jogos de azar, teve a suspensão dos relvados reduzida para oito meses e encontra-se atualmente fora de qualquer atividade ligada ao futebol.
Em outubro de 2023, a manipulação chegou à concentração da seleção italiana, com Tonali, do Newcastle, e Nicolo Zaniolo, do Aston Villa, a serem procurados pela polícia italiana, em plena preparação da Azzurra, após serem citados num esquema de manipulação de resultados, que também tinha a participação de Nicolo Fagioli, médio da Juventus.
Tonali, reforço do Newcastle, foi suspenso do futebol por 10 meses, enquanto Fagioli recebeu pena de sete meses. Nicolo Zaniolo deverá receber uma punição mais branda, já que ficou provado que não apostou em jogos de futebol, mas apenas em poker e blackjack.
Outro jogador que teve o seu nome ligado a um esquema de manipulação de resultados foi o brasileiro Lucas Paquetá. O caso continua a ser investigado pela FA e o médio continua em plena atividade pelo West Ham.
Apesar de nenhuma pena ter sido aplicada, a situação afetou a carreira do jogador, que era pretendido pelo Manchester City, emblema que recuou das negociações após a denúncia e avançou para o luso-brasileiro Matheus Nunes. Paquetá deixou igualmente de ser convocado para a seleção brasileira.