Violência impede futebolistas de sonharem com a reforma na América Latina
As recentes intimidações contra a família do argentino Angel Di María, o sequestro por guerrilheiros do pai do colombiano Luis Diaz e a chantagem contra a mãe do peruano Paolo Guerrero assustaram os ídolos de uma região abalada pelo narcotráfico e pelo crime.
O futebol como alvo da máfia não é um fenómeno novo. Os irmãos argentinos Gabriel e Diego Milito, o compatriota Carlos Tevez e o brasileiro Luis Fabiano também tiveram os seus entes queridos sequestrados, mas não desistiram de voltar aos seus países.
Tráfico de drogas
No final de março, os familiares de Di María receberam um bilhete embrulhado num saco de plástico. Desconhecidos atiraram o bilhete de um carro no bairro de Funes, a cerca de 20 km de Rosário.
Sem revelar o conteúdo do texto, as autoridades disseram que se tratava de uma ameaça de "organizações criminosas" numa cidade atingida pelo tráfico de drogas nos últimos anos. El Fideo, que fez a sua estreia pelo clube local Rosario Central, não comentou.
De acordo com o canal de televisão TyC Sports, que cita fontes próximas de Di María, o atual jogador do Benfica descartou um regresso à equipa argentina, como pretendia fazer a meio do ano, para "dar prioridade à segurança e saúde da sua família".
No passado, o jogador do Benfica havia declarado que um dos seus sonhos era voltar a jogar pelo Rosario Central para ganhar uma Libertadores antes de se retirar.
Também na mesma cidade, criminosos dispararam sobre um supermercado pertencente a parentes de Antonela Roccuzzo, esposa de Lionel Messi, há um ano.
No Equador, os cartéis podem arruinar as esperanças de Enner Valencia de voltar ao seu amado Emelec, já que a violência sem precedentes das drogas levou o governo a declarar o país em conflito armado interno e a decretar vários estados de emergência.
No meio destas medidas restritivas, em agosto de 2023, logo após a morte a tiro de um candidato presidencial, Valencia decidiu rumar ao Internacional, do Brasil.
"Gostaria muito de ir para o Emelec (...) e tentar ajudar a equipa que me deu tudo, mas não traria a minha família para o Equador e não me traria agora", confessou Valencia ao jornalista argentino Martin Liberman.
Sequestro
Em 2022, Elsy Valencia, irmã do "Super-Homem", esteve raptada durante mais de uma semana na fronteira com a Colômbia até ser resgatada por agentes da polícia.
O colombiano Luis Diaz passou pela mesma experiência em outubro e novembro do ano passado. Os guerrilheiros do Exército de Libertação Nacional (ELN) raptaram o seu pai, Manuel Diaz, em Barrancas (norte).
O treinador de futebol amador passou 12 dias nas mãos do grupo mais antigo das Américas, numa cadeia de montanhas na fronteira com a Venezuela. Foi libertado sob pressão das autoridades, que estão a negociar a paz com os rebeldes.
O melhor marcador da seleção nacional colombiana, Radamel Falcao, confessou dias depois que estava perto de regressar ao Millonarios de Bogotá, mas o rapto do pai do ex-FC Porto fê-lo hesitar.
"É preciso ver a situação do país neste momento, é um pouco complexa (...) São coisas negativas que nos fazem pensar e talvez abrandar", disse El Tigre, atualmente no Rayo Vallecano, ao Telepacífico.
Em março, a polícia colombiana explicou que criminosos enganaram a irmã e o cunhado do ex-jogador Carlos Bacca para que dirigissem até um local sem rede no telemóvel, tendo depois ligado para o avançado informando que eles haviam sido sequestrados e exigindo dinheiro em troca da suposta libertação.
Extorsão e ameaças
A extorsão, um dos crimes mais comuns na América Latina e com milhares de vítimas, é uma prática desenfreada no Peru.
Em fevereiro, o avançado Paolo Guerrero abalou o mercado do futebol inca ao assinar pelo César Vallejo, a primeira camisola que vestiu no seu país natal, aos 40 anos.
Mas membros do gangue Los Cachacos de Yolin começaram a extorquir a sua mãe através de mensagens de texto.
O Depredador esteve a ponto de romper o vínculo com o clube, mas decidiu ficar depois de exigir garantias de segurança.
Uma situação de perigo semelhante levou o extremo Willian a fugir do Brasil em agosto de 2022, quando acabara de voltar da Europa para o Corinthians, o segundo clube mais popular do país.
O jogador apresentou duas queixas por ameaças e insultos de adeptos alvinegros nas redes sociais contra ele e outros membros da sua família, incluindo as filhas menores de idade. Acabou por regressar a Inglaterra.
E tinha motivos para temer: o ex-avançado canarinho Fred foi vítima de um assalto à mão armada em novembro, num bairro do Rio de Janeiro, para roubar o seu carro e telemóvel.
Um mês depois, Marcelinho Carioca, ídolo do Corinthians, foi sequestrado por um dia e meio antes de ser resgatado.